São Paulo, quarta-feira, 12 de julho de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Não é verdade

GILBERTO DIMENSTEIN

O IBGE divulgou ontem que existiriam hoje no Brasil 20% de jovens e adultos analfabetos -segundo suas projeções, esse número baixará para 15% quando cruzarmos o milênio. Há um problema nessa informação: ela não é verdadeira.
O critério utilizado no Brasil é primitivo: basta o indivíduo saber escrever o nome para ser considerado alfabetizado. Isso e nada são, na verdade, iguais. É quase igual à simples digital. Daí se vê o tamanho do desafio educacional brasileiro e nossa baixa taxa de democracia.
O processo de alfabetização demora, no mínimo (e coloca mínimo nisso), as quatro primeiras séries -a partir daí, se inicia o processo de entendimento do que se está lendo. A julgar pelo nível da maioria das escolas públicas, nem esse período teria validade.
Por esse critério, há indicações muito mais fiéis à realidade brasileira: educadores calculam que pelo menos 60% dos eleitores sejam, de fato, analfabetos.
Mesmo considerando-se os critérios oficiais, os números já são escandalosos para um país classificado como uma das maiores economias do mundo. Em 1991, 30% das crianças com menos de 14 anos moram em residências com chefes de família analfabetos. Essa proporção cresce para 50% no Nordeste.
Monta-se, aí, o ciclo de ferro da ignorância: pais ignorantes, que geram filhos ignorantes, que, por sua vez, serão pais ignorantes. Os responsáveis pela quebra desse ciclo deveriam ser os governos federal, estaduais e municipais -até agora, apesar dos avanços, fez-se pouco.
Só se obtiveram esses indicadores vexaminosos que, comparativamente, são piores do que nações da África, da América Latina ou sul da Ásia, por um motivo: os donos do poder são ignorantes ou se aproveitam da ignorância.
PS - Vale a pena prestar atenção nas experiências patrocinadas pela Câmara do Comércio Brasil-Estados Unidos, que adotou escolas no interior de São Paulo. Com pouco dinheiro, investe-se basicamente na melhoria do professor. Resultado: a repetência e a evasão escolar estão caindo drasticamente. Em Cuiabá, graças a inovações pedagógicas da prefeitura, já existem escolas públicas que praticamente erradicaram a evasão.

Texto Anterior: O desafio do vencedor
Próximo Texto: Os neo-escravos
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.