São Paulo, quarta-feira, 12 de julho de 1995
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Câmbio real

ANTONIO DELFIM NETO

A revista ``The Economist" publicou em sua edição de 3 de junho (pág. 98) dois gráficos interessantes que mostram as taxas de câmbio reais efetivas de vários países asiáticos e latino-americanos. As taxas de câmbio reais efetivas são calculadas como uma média aritmética ponderada pelo peso dos parceiros de cada país nas suas exportações, corrigidas pelos diferenciais de taxa de inflação.
Como é claro, a taxa de câmbio real efetiva é um indicador sujeito a manipulação, principalmente pelas autoridades monetárias que sempre insistem em violar a primeira lei de Stanley Fischer, que afirma ``que uma moeda está sobrevalorizada sempre que a autoridade monetária procura um índice conveniente de acordo com o qual ela não está sobrevalorizada".
Por outro lado, há uma enorme dificuldade em entender que a taxa de câmbio real é um preço relativo que determina, ao mesmo tempo, quanto de bens transacionáveis (bens que podem ser importados ou exportados) e de bens não transacionáveis (bens e serviços que não podem ser importados ou exportados) vão ser produzidos e consumidos no país. É precisamente por isso que ela determina o saldo na conta de mercadorias (exportação menos importação). E, se a conta de serviços é relativamente fixa ou proporcional à conta de mercadoria, é ela que determina o saldo da conta corrente.
O que mais chama a atenção no gráfico a que nos referimos é que o Brasil (seguido de longe pela Argentina) é o país que apresenta a maior variabilidade da taxa de câmbio real. Nos últimos dez anos (1986-1995) a taxa de câmbio real apresenta dois surtos de valorização (1986-89 e 1992-95) que introduziram uma enorme incerteza nos negócios de exportação. Quando comparamos esses movimentos com o Chile ou a Colômbia (e com o México até 1992) podemos entender melhor por que temos sofrido convulsões mais frequentes.
Mas a comparação mais interessante é com os países asiáticos. A Coréia e Taiwan mostram uma valorização até 1989 (em torno de 20%) e depois uma desvalorização lenta e persistente até 1995. Hong Kong e Cingapura mostram uma valorização continuada (de 30% e 20%, respectivamente, em dez anos!), mas sem flutuações importantes. Os dois países têm déficit na conta de mercadorias.
Todos esses países (com exceção do México) têm mantido a sua conta corrente sob controle com variados sistemas cambiais e sucesso no controle da inflação: Coréia, 5% ao ano; Taiwan, 4%; Kong Kong, 3%; Cingapura, 2%. O mesmo ocorre com o Chile (8% ao ano), que tem apresentado um crescimento invejável.
O caso colombiano é mais duvidoso. O seu déficit visível em conta corrente está entre 4% e 5% do seu PIB há alguns anos, e sua taxa de inflação permanece no patamar de 20%. O ponto positivo é um crescimento vigoroso superior a 5% nos últimos três anos. A Colômbia também apresenta uma lenta -mas importante- valorização do seu câmbio real desde 1990.
Essas ligeiras observações mostram que não adianta tentar se iludir. Não é preciso uma supervalorização da moeda nacional para ter sucesso no controle da inflação. Pelo contrário. Ela pode ameaçar gravemente o programa.

Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

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