São Paulo, quinta-feira, 13 de julho de 1995
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Associação acusa Bienal de `calote cultural'

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DA REPORTAGEM LOCAL

A repercussão internacional do artista plástico sergipano Arthur Bispo do Rosário (1911-1989) provoca uma disputa pelo controle da sua obra.
A Associação de Amigos dos Artistas da Colônia Juliano Moreira -que detém a guarda do acervo de Bispo- acusa a Fundação Bienal de São Paulo de faltar com a ética e se apropriar do prestígio da produção do artista.
``A Bienal está dando um calote cultural", diz o arquiteto Gerardo Vilaseca, 47, presidente da sociedade. ``Monopoliza a curadoria internacional da obra de Bispo, ao mesmo tempo que se apropria do nome do artista sem preservar a integridade da obra, que continua em situação precária."
A Bienal promove a mostra de 140 peças de Bispo na Bienal de Veneza, que acontece até 15 de outubro. Em abril, a instituição firmou um convênio com o Ministério da Saúde, trocando o direito de expor Bispo no circuito internacional pela restauração das obras.
Essas pertencem ao ministério, que administra a Juliano Moreira, instituição psiquiátrica onde Bispo viveu internado por cinco décadas. A Associação foi fundada em 1989 com o fim de preservar a obra de Bispo. Mas não é reconhecida pelo ministério.
``A associação, responsável pela projeção de Bispo, não foi considerada", diz Vilaseca. ``Queríamos que um dos nossos 60 membros monitorasse a obra em Veneza, e nem essa hipótese foi considerada."
Vilaseca enviou ontem à Folha um documento intitulado ``Monopólio Cultural", em que denuncia o oportunismo da Bienal: ``Em época de quebra de monopólios históricos, caberia uma reflexão mais profunda sobre tal acordo".
Segundo Vilaseca, a Bienal usou de influência junto ao governo para se apropriar da obra. ``A maneira como foi feito o restauro não teve profissionalismo", diz Vilaseca. ``Foi restaurada só uma pequena parte da obra e faz uso da imagem de Bispo. Uma mostra representativa deveria considerar as 600 obras."
Vilaseca afirma que a Bienal está negociando com a indústria de calçados Alpargatas S.A., de São Paulo, a cessão de cópia fotográfica da vitrine com congas, de Bispo, para brinde de fim de ano, à revelia da associação.
O crítico Nelson Aguilar, curador da mostra, rebate: ``Essa associação é provinciana. Está arraigada no cadáver do artista e pretende tirar benefício dele. Desejava transformá-lo no `Homem Elefante' da arte brasileira, levando a obra para passear no circuito da arte bruta, dos loucos e marginais. Tiramos Bispo da sarjeta e fornecemos à sua obra projeção internacional. Hoje é um artista cosmopolita. A associação não passa de uma atravessadora."
Para Romão Pereira, gerente de eventos da Bienal, membro da associação, Vilaseca quer ``entrar na história sem ter cacife": ``É curioso que seja uma associação de artistas mas que só protege Bispo, desconsiderando outros. De fato, é uma sociedade protetora da obra de um único artista".
Segundo Pereira, a Alpargatas vai pagar R$ 6 mil pelo uso da vitrine de congas: ``Isso vai ajudar na recuperação das outras obras. E foi iniciativa da Bienal começar negociações com a empresa."

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