São Paulo, sábado, 15 de julho de 1995
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Autofagia fiscal

Há uma guerra fiscal em curso. As vítimas às vezes não se percebem como vítimas, nem sabem quem afinal as vitima, ou como.
``Guerra fiscal" é o abuso, nas esferas estadual e municipal, de concessões, subsídios ou isenções com vistas a atrair investimentos. A arma principal nessa disputa tem sido o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
O episódio mais recente e notório foi a decisão de uma montadora em favor de instalar-se no Rio de Janeiro com base, supõe-se, em generosas isenções de ICMS oferecidas pelo governo daquele Estado.
Mais decisivas, entretanto, serão as batalhas que se travarão no Congresso Nacional no segundo semestre. O governo emite sinais de que defenderá uma ``federalização" do ICMS. Ou seja, seria retirada dos Estados a prerrogativa de legislarem sobre esse imposto.
As reações mais vigorosas já se fazem sentir, em especial entre os políticos da bancada nordestina. Assim como ocorreu na questão agrícola, as forças políticas não estarão divididas por partido ou ideologia. No caso, valerá a fronteira em geral imediatista e particular dos interesses regionalistas mais estreitos.
E, se políticos do PFL já se opõem a esse princípio de reforma tributária, conclua-se que o governo não contará com a aliança governista para aprovar seu projeto.
Entretanto, antes mesmo de entrar no mérito regional da disputa, é preciso ter bem claro o resultado da chamada ``guerra fiscal". Estima-se em mais de R$ 1,5 bilhão a perda de arrecadação provocada atualmente pelas isenções de ICMS.
É fato que setorial ou regionalmente as isenções de ICMS muitas vezes surtem efeito e podem até gerar mais arrecadação. Mas, se todos recorrerem à mesma tática, serão dramáticos os efeitos ``colaterais". Do ponto de vista mais amplo da justiça distributiva e da preservação da capacidade de gasto dos Estados em áreas de sua exclusiva competência, como a social, a do saneamento básico, a educacional ou a da segurança, uma guerra fiscal de todos contra todos pode deixar mais mortos que feridos.
O desenvolvimento regional é uma necessidade e uma responsabilidade nacional. Medidas de estímulo devem ser usadas, sob várias formas e envolvendo diretamente o governo federal, além do uso (nunca abuso) de favorecimentos locais.
Mas aquilo que na visão de alguns aparece como uma guerra santa pela conquista de investimentos é na verdade uma autêntica autofagia fiscal, que destrói a nação e mina a governabilidade.

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