São Paulo, terça-feira, 18 de julho de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O governo que se nega

JANIO DE FREITAS

O mínimo a dizer dos R$ 6 bilhões que o governo federal concederá ao de São Paulo, que os utilizará como pagamento de metade da sua dívida no Banespa, é que se trata do cúmulo do despudor administrativo e político, para não entrar no pessoal. Pela concessão em si, pela fonte dos bilhões, pelas condições e pelos motivos, este ato é, sozinho, o desmentido de tudo o que Fernando Henrique Cardoso e José Serra pregaram como comportamento necessário ao governo e às relações dele com os Estados.
Os R$ 6 bilhões são o exato montante buscado em vão pelo ministro Adib Jatene para socorrer a saúde nacional. Vão sair do Banco do Brasil, mais uma vez submetido à exploração política e no momento em que, à falta de um plano inteligente, adota a autoritária demissão em massa como suposta solução para seu crescente prejuízo.
Por que São Paulo terá o direito de pagar juros internacionais? Ou seja, pagará por ano o que os juros nacionais, fixados pelo próprio governo Fernando Henrique, valem em um mês? E por que pagamento até 2025, 30 anos? Só há uma resposta para as duas perguntas: é por ser São Paulo base da ação política e fonte financeira dos principais barões do PSDB.
Até agora, nenhum dos atuais governadores mostrou altivez na defesa, de fato, perante o governo federal, dos interesses dos seus Estados. Tudo fica no arremedo de ação, na conversinha infrutífera, na emasculação das responsabilidades de governantes. São muito decididos e inflexíveis, todos, quando se trata de tornar mais torturante a vida dos de baixo, especialmente se forem funcionários desarmados. Assim se faz a facilidade com que Fernando Henrique e José Serra concedem mais e mais privilégios a São Paulo. E não se suponha que são concessões a Mário Covas, cujas ponderações sobre os efeitos estaduais da política econômica, desastrosos para a arrecadação presente e futura de todos os Estados, não recebem a menor atenção dos seus correligionários.
As mágicas que podem ser criadas para São Paulo não o podem ser para a saúde. Aí o governo é rigoroso. Não por política administrativa, mas por políticas pessoais. Há uma semana, o pessoal de José Serra plantou na imprensa a notícia de que Adib Jatene quer aparecer como lutador por verbas porque tenciona candidatar-se à Presidência. Não é preciso mencionar a profundidade dessa baixeza. Mais convém inverter logo a alegação.
Pretendente à Presidência e, como alternativa, ao governo de São Paulo, Serra não retém as verbas para a saúde, retém Adib Jatene. Com um bom trabalho, Jatene, querendo ou não, estaria entre os mais fortes candidatos à Presidência ou ao governo paulista. A Fernando Henrique, por sua vez, é preferível deixar livre o caminho de Serra para a alternativa paulista: quanto menos obstáculos ao projeto de reeleição, melhor. E, como estas duas políticas pessoais, volta-se à sucessão de privilégios para a base política e financeira dos barões.

Texto Anterior: Incra investiga 'indústria das indenizações'
Próximo Texto: Governadores isolam SP em discussão de impostos
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.