São Paulo, quinta-feira, 20 de julho de 1995 |
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Caminhonaço da agricultura
VICTOR FACCIONI Seguramente, nenhuma nação democrática do mundo, fez ou faz com sua agricultura o que os últimos governos brasileiros têm feito com a nossa. Vejamos o que já aconteceu com o trigo.O setor agrícola vem sofrendo violento e crescente endividamento, em razão da defasagem que começou no Plano Cruzado entre a correção dos preços mínimos e os juros mais a correção do crédito agrícola. O Brasil tem praticado a mais elevada e desproporcional taxa de juros agrícola -juro real- do mundo. Tal situação se agravou ainda mais com o plano da URV e do Real, inclusive na concorrência das importações subsidiadas. A gravidade da situação levou o Congresso a fazer uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), em 1993, cujas conclusões foram aprovadas pela unanimidade dos partidos ali representados. A despeito da CPMI e suas conclusões, o governo sempre tangenciou, como agora, mas não se moveu para uma solução efetiva e plena. Nem depois do Congresso ter derrubado o veto do presidente Itamar à MP da URV, estabelecendo na lei a ``equivalência-produto" nos financiamentos agrícolas. O quebra-quebra já se estende a outros setores da agroindústria. Na verdade, sendo comprometida a sobrevivência do setor primário, compromete-se também a própria agroindústria, comércio e serviços. Em maio de 1993, quando requeri a instalação de uma CPMI para apurar ``as causas e consequências do endividamento do setor agrícola, o elevado custo dos seus financiamentos e as condições de importação de alimentos nos exercícios de 1990 a 1993", eu não podia imaginar tanta falta de sensibilidade e visão do governo sobre a agricultura, nem o cipoal de interesses em jogo que o processo todo iria ter pela frente. Como a agricultura brasileira, em épocas anteriores, havia recebido muito apoio governamental e alguns produtores haviam se aproveitado e desviado recursos favorecidos por subsídios expressivos, a imagem de tal desvio era ou ainda é o mínimo que jogam contra qualquer argumento sobre o endividamento posterior, como se tais subsídios tivessem sido mantidos a partir da Nova República e o Plano Cruzado não tivesse iniciado um processo inverso e altamente prejudicial para a agricultura. Ou ainda, como se todos os produtores -e não apenas alguns- tivessem sido ``aproveitadores gananciosos e desviadores de recursos subsidiados" que antes o governo, via Banco do Brasil, assegurava para os produtores. Somente o Judiciário considerou, até aqui, os fatos apurados pela CPMI, comprovando o processo inverso ao anterior, que era de subsídios e apoio favorecido aos produtores, o que ainda é feito hoje em todo o mundo. Processo inverso aqui, desde o Plano Cruzado, agravando-se o ônus desproporcional sobre a agricultura nos planos subsequentes. No entrevero desta luta, os que prosseguem se deram conta que a resistência individual, ou das cooperativas, está chegando ao fim, com a ameaça de quebra geral. Daí, no desespero, surgiu a idéia do ``caminhonaço", na última tentativa de fazer ver, não mais e apenas ao governo, mas à própria imprensa e sociedade brasileiras, a verdade real dos fatos e a possibilidade que ainda resta para a agricultura sobreviver. Afinal, se o Brasil precisa comer, não vai ser apenas importando, mas aqui produzindo os alimentos para o mercado interno e para exportar, gerando assim investimentos, empregos e renda não apenas no setor primário, mas em toda a cadeia econômica da indústria, comércio, serviços e ao próprio governo. Eis que vem caindo drasticamente a arrecadação de impostos e aumentando consideravelmente o desemprego e o êxodo rural, que urge estancar. Para tanto, basta lembrar o que fez Roosevelt com a agricultura americana no ``New Deal". Li na Folha o depoimento de Pedro de Camargo Neto, vice-presidente da SRB (Sociedade Rural Brasileira), afirmando ``que ainda há tempo de o governo evitar o risco de desestabilizar o setor para o ano que vem". Que a ``Marcha sobre Brasília" encontre o governo com real disposição para tanto, e se consiga evitar uma brutal queda de produção. Texto Anterior: Um aspecto meio esquecido da reforma tributária Próximo Texto: Japão tem maiores empresas do mundo Índice |
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