São Paulo, quinta-feira, 20 de julho de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Um novo modelo agrícola

JOSÉ EDUARDO DE ANDRADE VIEIRA

Até hoje o setor agrícola, vital para o desenvolvimento econômico brasileiro, tem sido submetido a um modelo fechado, com forte intervenção estatal no mercado e tentativas, geralmente malsucedidas, de garantia de renda para o agricultor, por meio de incentivo a culturas quase sempre muito custosas, concentradoras de renda e com grande desperdício dos estoques reguladores. Esse modelo tem acumulado problemas ao longo dos tempos.
Este governo, sob o comando de Fernando Henrique Cardoso, resolveu enfrentar tais problemas, para os quais a sociedade reclama soluções corretas e urgentes, deixando de adiar essa tomada de posição, o que tem sido feito até agora.
As mudanças verificadas e as que estão sendo engendradas refletem a nova postura do Estado brasileiro de não mais ``empurrar com a barriga", enfrentando as dificuldades que surgem, definindo claramente os limites da ação do governo e abrindo para a sociedade a perspectiva de participar mais e de influir nas decisões tomadas.
O governo Fernando Henrique Cardoso, fiel à palavra empenhada em seu programa, divulgado ainda na campanha eleitoral e publicado em livro sob o título de ``Mãos à Obra, Brasil", não apenas ouve e aceita a palavra de sindicatos, entidades de classes, movimentos comunitários e representações locais, como até estimula sua participação efetiva e decisiva nos rumos a serem adotados.
O objetivo dessa atitude é encerrar o modelo interventor da forma menos traumática possível para o setor agrícola, que tem assumido sempre o ônus do desenvolvimento econômico do Brasil, praticamente sem levar nenhum benefício por isso.
Os novos rumos são traçados dentro do quadro referencial de estabilidade econômica e crescimento baseado em eficiência e livre competição, proporcionada pela abertura do mercado. Como o velho modelo foi muito abalado pelos sucessivos planos econômicos, que provocaram distorções dos preços, ``descasamentos" de taxas e formação de grandes estoques governamentais de produtos de difícil colocação no mercado, tornou-se necessário reavaliar e adaptar os instrumentos de política agrícola à nova realidade da economia.
Como o setor, enterrado numa situação praticamente insustentável por tal modelo, tem enfrentado forte concorrência e exigências cada vez maiores de consumidores expostos a produtos de melhores qualidade e preço, que passam livremente por nossas fronteiras, é preciso desenvolver novos instrumentos para buscar soluções estruturais.
Tais instrumentos devem ser desenvolvidos a partir da certeza de que o tratamento dado aos produtores pelo governo precisa ser diferenciado. O governo não pode mais ter uma única política agrícola, mas, no mínimo, duas.
Pois a agricultura dita capitalista, equipada tecnologicamente e com capacidade de competir nos mercados interno e externo, não precisa ser presenteada com capital de giro obtido por privilégios nos preços e subsídios do Tesouro. O crédito de custeio deve ser orientado para produtos que sejam objetos de ação específica de recuperação e para pequenos produtores. Assim, o Tesouro será desonerado para garantir crédito para investimentos.
A administração e controle públicos de transferência de renda mostraram ser, na prática de anos do modelo agrícola equivocado adotado pelo governo, muito onerosos e, no mais das vezes, ineficazes para alcançar os objetivos propostos originalmente. O público-alvo tem de se organizar para controlar tais transferências e deixar de atuar de forma dependente da ação paternalista do Estado.
O governo central não pode mais recorrer a ações paliativas para escamotear os conflitos entre o atendimento das necessidades sociais dos grupos excluídos e os interesses dominantes locais. Esses têm de encontrar um caminho de negociação também local, dentro do espírito de descentralização que preside as ações do governo Fernando Henrique Cardoso.
O que pode ser resolvido no local de origem deve ser resolvido no local de origem, e não ser transferido para o centro, entravando as soluções e avolumando os problemas, tal como tem ocorrido. A ordem é enfrentar os problemas e dar-lhes soluções definitivas, deixando de transferi-los permanentemente para o futuro.

Texto Anterior: ARREPENDIDO; O SER LEVE; MAIS HOMENS
Próximo Texto: O consenso do bom senso
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.