São Paulo, sábado, 22 de julho de 1995
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Brasil mostra a cara

ALBERTO HELENA JR.

Consegui escapar de Macondo, digo, Livramento (que não se perca pelo nome), coberta por uma impenetrável calota de chumbo, através da qual só varava o zumbido do aviãozinho, tentando em vão uma fresta de luz para descer no desolado aeroporto de Rivera.
Mais desoladas que o campo de pouso eram as almas dos 15 a 20 passageiros que aguardavam havia dois dias a vinda do pássaro alado.
Os funcionários da companhia aérea, num dado momento, me lembraram Cary Grant e Harry Carey, com seus heróicos teco-tecos perfurando a neblina, entre perigosas montanhas em qualquer lugar solitário próximo à linha do Equador.
Fomos de ônibus mesmo.
Enfim, dei um pulo em São Paulo, e já estou de volta à seleção, que repousa sob o céu de um azul límpido e gélido de Punta del Leste.
Ao invés da monotonia dos pampas amarelecidos pelo inverno de Macondo, digo, Livramento, o mar, orlado de um verde esfuziante, onde se encravam, aqui e ali, belas residências no chamado estilo pós-moderno.
Com este céu, com este mar, como diria o poeta popular, nosso time, desta vez, terá de desencantar.
Sim, porque houve uma progressão, desde a estréia até o jogo contra a Argentina. Aí patinamos, e só seguimos em frente graças à mãozinha do juiz. Melhor dito: do Túlio.
A propósito, não me surpreendeu a repercussão que teve aí no Brasil meu comentário de outro dia sobre o indecente gol de empate da seleção contra a Argentina.
Pois, há muito, minha gente desaprendeu a singela capacidade de distinguir o certo do errado, substituída, praticamente em todos os níveis, pelo cotejo sofisticado do que é mais conveniente ou não. A famosa lei de Gérson, vocês sabem.
Aliás, não é à toa que esse vezo foi batizado com o nome do Canhotinha de Ouro, que, por sinal, fica tiririca com essa história. Mas é que o futebol atua sobre nossas vidas mais ou menos como um campo de prova da catarse nacional.
No futebol, o que é dito e feito entre ouvidos, escancara-se e ganha curso como num bloco de sujos em pleno Carnaval. Arriscaria a dizer mesmo que é o nosso psicodrama, onde o personagem coloca a máscara para desmascarar-se de fato, como no teatro grego.
Ou, como na musiquinha da novela: Brasil, mostra a tua cara.
Mostrou.

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