São Paulo, sábado, 22 de julho de 1995
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Thompson volta mais ousada em "Carrington"

ELAINE GUERINI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Aos 36 anos, a inglesa Emma Thompson abandona a linha romântico-recatada para encarnar uma mulher mais ousada. Em "Carrington", com estréia prevista para setembro, a atriz vive uma pintora que se apaixona por um homossexual e acaba se consolando nos braços de vários amantes.
O filme, dirigido pelo estreante Christopher Hampton (roteirista de "Ligações Perigosas"), é baseado na complicada relação entre a pintora Dora Carrington e o crítico Lytton Strachey na Inglaterra pós-vitoriana. Strachey, vivido por Jonathan Pryce, era o líder do Bloomsbury -grupo formado por intelectuais, artistas e escritores (Virginia Woolf entre eles).
Para seguir a tendência da época -quando o setor artístico rejeitava o moralismo- Emma precisou se arriscar em cenas eróticas. O resultado não se compara às artimanhas de Sharon Stone, mas, para quem andava se especializando em papéis contidos, "não está nada mau (como ela mesma diz).
"Não tenho um corpo maravilhoso, mas não me incomodo em filmar sem roupa", disse a atriz em entrevista por telefone, de Londres.
Desde a semana passada, quando terminaram as filmagens de "Sense and Sensibility" -seu primeiro trabalho como roteirista-, a atriz está em casa, em clima de férias. "Não quero saber de trabalho por um bom tempo".
Bem-humorada, Emma falou do novo papel, das cenas ousadas, da experiência como roteirista, de Hollywood e do medo de não sobreviver nas telas depois dos 40. Leia a seguir, os principais trechos da entrevista.

Folha - Como você classifica Carrington neste momento de sua carreira, depois de se firmar com papéis românticos e recatados?
Emma Thompson - É um desafio, uma mudança. Carrington é bem diferente de tudo o que eu já fiz. Ela não é uma mulher que se controla o tempo todo, como a maioria das minhas personagens.
Apesar de ter se mantido virgem por um bom tempo, resistindo firmemente às investidas de vários pretendentes, Carrington era uma mulher poderosa e perversa.
Era uma teimosa que rejeitava os princípios morais da época. A arte era uma forma de protesto, assim como a paixão por um homossexual e a opção por amantes. Tudo o que ela queria era ser livre para fazer o que bem entendesse.
Folha - Como você se saiu nas cenas eróticas?
Thompson - Sem dúvida, estas foram as cenas mais ousadas da minha carreira. Mas eu tenho que admitir que eu me diverti muito. Passei todo o verão beijando homens jovens. Foi fabuloso (risos). Todos eles foram muito gentis comigo, bons amigos.
Eu não fiquei constrangida. Eu não sou nenhuma Sharon Stone, com um corpo maravilhoso, mas acho que as minhas cenas não ficaram más. Gosto da idéia de o cinema mostrar corpos normais.
Mas o importante mesmo é não deixar o erótico cair no grotesco, o que infelizmente acontece na maioria dos casos. Em "Carrington, tivemos uma preocupação muito grande nesse sentido. As cenas são quentes, mas têm estilo. A mais forte delas mostra a personagem transando com um de seus amantes, o ator Jeremy Northam. Ele a pega por trás em um barco.
Folha - Você nunca pensou em fazer um papel mais ousado em Hollywood?
Thompson - Não. Infelizmente, Hollywood retrata quase todas as mulheres sexualmente liberadas como vilãs e eu odeio isso. Lá, é raro encontrar uma personagem complexa como Carrington, uma mulher fascinante, com várias facetas e mistérios.
Um papel assim não desperta o interesse da indústria. Lá, eles só se preocupam em fazer dinheiro e os papéis femininos seguem sempre os mesmos moldes. É sempre a mesma coisa: ela é a mãe, a esposa, a vítima ou a prostituta. A única coisa que me consola é que o público não leva esses filmes a sério, ou pelo menos não deveria.
Folha - Como foi sua primeira experiência como roteirista?
Thompson - Foi maravilhosa. Jane Austen sempre foi uma de minhas autoras favoritas e eu pude conhecê-la melhor (Austen escreveu em 1811 "Sense and Sensibility", livro que inspirou o mais novo filme do diretor Ang Lee, rodado no interior da Inglaterra).
Foi um trabalho longo e cansativo, mas valeu a pena. Ao todo, eu levei cinco anos para escrever o roteiro. Tive que interromper o projeto várias vezes por causa de filmagens.
Folha - Você já sabia que ficaria com o papel principal quando começou a escrever?
Thompson - Não. Eu recebi uma proposta para fazer o roteiro, mas não tinha certeza de que faria a protagonista. Eu achava que seria melhor se eu não o fizesse. Fiquei com medo de cair no estrelismo, de escrever para mim mesma. Pensei que pudesse ficar confusa com tantas responsabilidades.
Mas quando chegou a hora de definir os papéis, percebi que era a decisão mais acertada. E acabou dando certo. Foi uma ótima experiência, o trabalho mais envolvente de toda a minha carreira. Eu tenho que admitir que eu adorei me intrometer em vários aspectos do filme. A verdade é que eu fiquei ainda mais mandona (risos).
Folha - Você se preocupa com a idade? Algumas atrizes reclamam que a carreira fica limitada depois dos 40.
Thompson - Felizmente, ainda não é meu caso. Mas tenho medo que isso aconteça comigo também. Com o tempo, as atrizes deixam de receber tantos convites. São poucas que sobrevivem em grande estilo, como Glenn Close, Anjelica Huston e Vanessa Redgrave.
É exatamente por isso que eu já comecei a me preparar atrás das câmeras. Além de roteirista, eu já pensei em atuar como diretora. É uma outra possibilidade.
Folha - Quando você e Kenneth Branagh (marido da atriz) voltam a trabalhar juntos?
Thompson - Nós pretendemos trabalhar juntos no ano que vem. Ele está pensando em fazer uma versão de Hamlet e deve me dar algum papel. Mas eu prometo que, apesar da minha idade, não vou fazer o papel de mãe dele (risos).
Desta vez, ele não vai se atrever a me deixar de fora. Mesmo sabendo que "Frankenstein" não tinha nenhum papel para mim, eu admito que fiquei um pouco chateada por não participar do projeto. A filmagem durou vários meses e nós ficamos muito separados.
Folha - O Oscar que você recebeu em 1993 (pela atuação em "Retorno a Howard's End") mudou alguma coisa em sua vida? Melhorou o seu cachê?
Thompson - O Oscar só é importante no dia da premiação. Depois, ninguém mais se lembra. Com relação ao cachê, também não mudou muita coisa. Quando recebo uma proposta, procuro saber qual é o orçamento do filme para depois acertar um valor que eu considere justo.

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