São Paulo, domingo, 23 de julho de 1995
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PC se torna guru em presídio de Maceió

XICO SÁ
ENVIADO ESPECIAL A MACEIÓ

- Não fuja mais, rapaz, isso complicou a sua situação.
- É, PC, eu acho que errei.
- Veja o meu exemplo, eu sei que fugir é loucura, só prejudica.
O diálogo foi travado entre o empresário Paulo César Farias, 49, e o detento G.B.S, 37, condenado a 26 anos de cadeia por homicídio e duas fugas do presídio.
Os presos ouvem com atenção, nos corredores do Instituto Penal de São Leonardo, na periferia de Maceió, as ``lições" de PC.
Desde o mês passado, quando começou a prestar serviços à Secretaria de Justiça de Alagoas, como parte do cumprimento da sua pena imposta pelo STF (Supremo Tribunal Federal), PC é visto como uma espécie de guru pelos presos.
A direção da penitenciária permitiu a entrada da Folha no local desde que fossem preservados os nomes completos dos presos, sob o argumento de que muitos não foram condenados pela Justiça.
``O doutor PC aí é forte e vai ser nossa salvação", diz o detento J.F.S.
Além das lições e conversas, nas quais aconselha fé, paciência e otimismo aos detentos, o empresário ajuda também com um lado mais materialista.
Com telhas, por exemplo. Os presos reclamavam das goteiras no teto de um dos pavilhões do Instituto Penal. Muitos amanheciam molhados pela chuva.
A diretoria do presídio reconhece que, sem dinheiro, não teria condições de realizar a obra. PC foi lá e mandou consertar o telhado.
Rotina de assédio
Ao chegar à penitenciária, como na manhã da última quinta-feira, PC é recebido com euforia.
Quando seu Fiat Tempra preto cruza o portão que dá acesso ao Instituto Penal, os guardas o cumprimentam como a uma autoridade graduada do Estado.
Charuto cubano na mão, uma pasta com processos debaixo do braço, PC desce do carro que ele mesmo dirige e mal pode entrar naquele casarão de paredes mofadas, onde se alojam 343 presos.
PC é assediado logo na entrada por parentes dos detentos. É dia de visita de familiares na penitenciária. Mães aflitas, pais, mulheres, filhos que lhe pedem liberdade ou qualquer ajuda para os presos.
``Agora é Deus no céu, padim Ciço no Juazeiro e PC aqui dentro pra ajudar esse povo", diz Cícera de Souza, 22, namorada de um dos detentos, que chega ao presídio para a visita semanal.
O tesoureiro da campanha do ex-presidente Collor, condenado a sete anos de prisão por crime de falsidade ideológica (movimentar contas bancárias "fantasmas), anota os pedidos, os nomes dos detentos e começa o seu trabalho.
Advogado, o ex-tesoureiro e protagonista do Collorgate faz parte do programa ``Mutirão da Justiça", composto por funcionários do governo e estudantes de direito, com o objetivo de estudar a situação penal dos presos.
``Estamos fazendo um serviço inédito em Alagoas, e o clima é muito bom no momento na penitenciária", afirma o diretor de Classificação e Triagem, José Correia Medeiros Júnior.
PC tem dedicado a maior parte de seu tempo na tentativa de conseguir para os presos o direito que ele mesmo conquistou recentemente: o de cumprir a pena em regime mais brando. O empresário passa o dia entre a sua casa e o trabalho comunitário e apenas à noite se recolhe à prisão.
Segundo estudo feito por PC e a equipe da penitenciária onde trabalha, pelo menos 60 dos 343 detentos já poderiam estar livres ou em regime aberto.
O ex-tesoureiro vasculha as fichas desse tipo de preso, prepara diariamente pedidos de progressão para regime aberto e os encaminha para a Secretaria de Justiça, onde também dá expediente.
Segundo PC, ``o Estado poderia economizar e acabar com a superlotação nos presídios, se levasse a sério o direito dos presos".
``Dos que estão aqui, 95% são miseráveis que nunca ouviram falar do que seja um advogado." A maioria é acusada de assassinatos, incluindo alguns matadores profissionais. Outros são acusados de estupros e assaltos.

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