São Paulo, domingo, 23 de julho de 1995
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Otimismo marca conferência sobre Aids

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

A Segunda Conferência Nacional sobre Retrovírus Humanos e Doenças Relacionadas (principalmente à Aids), realizada em janeiro último em Washington (EUA), distinguiu-se dos recentes encontros rotineiros sobre essa moléstia pelo estado de espírito dos 2.300 participantes.
O grande otimismo em geral observado contrasta com o desânimo presente nas reuniões anteriores, em que predominaram comunicações triviais de complementação de informes precedentes.
Além disso, nos encontros anteriores vinham predominando trabalhos de natureza clínica, sem sólida base científica, em detrimento de pesquisas básicas sobre o vírus e seu modo de ação, base objetiva para a criação de novos tratamentos e meios de prevenção.
Entre os trabalhos apresentados, destacam-se os que tratam da produção do vírus e sua circulação, da etiologia do tumor de Kaposi, da ação de nova droga em combinação com o AZT, da resistência a essas drogas, além de pistas importantes sobre a proteína Nef, que muitos cientistas ligam ao poder destruidor do HIV, o vírus da Aids.
George Shaw e David Ho haviam demonstrado que milhões de unidades de HIV são diariamente produzidas e retiradas do sangue da pessoa infectada, descoberta que foi confirmada.
Esses dados contribuíram muito para a compreensão da luta entre o vírus e o sistema imune. O vírus multiplica-se vertiginosamente, o que, sem dúvida, concorre para agravar sua ação.
Felizmente surgiu uma nova droga, a 3TC, que aumenta muito a atividade do AZT, mas ainda não se sabe com certeza se ela é mais eficiente do que o DDC, já licenciado e em uso como reforçador do AZT.
Também se ignora se a combinação AZT-3TC reduz a incidência de infecções relacionadas com a Aids ou prolonga a vida dos infectados com o HIV. É curioso assinalar que, à medida que aparecem mutantes resistentes à 3TC, baixa a carga do vírus.
Joseph Eron Jr. analisou alterações na quantidade de HIV em indivíduos tratados com a combinação AZT-3TC e modificações em seu sistema imunológico. Esse resultado confirmou os bons efeitos da combinação, quando comparada com drogas isoladas. Os efeitos podem durar até um ano.
O sarcoma de Kaposi é conhecido há muito tempo, mas se tornou famoso quando se registrou sua frequência em homossexuais com Aids. Patrick Moore, Yuan Chang e colaboradores anunciaram haver isolado do tumor um vírus herpético especial, novo, cujo DNA representa o maior vírus de herpes até agora reconhecido.
Parece não haver dúvida quanto a ser o vírus o agente do tumor, sendo encontrado em pessoas portadoras deste e não infectadas pelo HIV.
A proteína reguladora Nef parece abrir caminho à produção da Aids pelo HIV. Ronald Desrosiers realizou experimentos nesse sentido com o vírus SIV (da Aids dos macacos).
Em condições especiais, ele conseguiu observar alterações da Nef numa região que controla a ligação às proteínas-cinases, enzimas que iniciam cascata de sinais, que vão do citoplasma celular ao núcleo.
Os dados mencionados, escolhidos pela revista "Science" dentre muitos outros, revelam a importância que teve a 2ª Conferência Nacional e o valor da união da pesquisa básica com a clínica.

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