São Paulo, domingo, 23 de julho de 1995
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Vítimas narram dramas da Bósnia

DO "THE INDEPENDENT"; DAS AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

Refugiados muçulmanos relatam histórias sobre fuga das cidades sitiadas pelos sérvios
s agências internacionais
Ao longo de três anos de guerra, o conflito na ex-Iugoslávia já matou mais de 40 mil pessoas, produziu dezenas de milhares de feridos e, segundo algumas estimativas, 2 milhões de refugiados.
Na semana passada, com a tomada de Srebrenica e Zepa pelos sérvios, voltaram a aparecer notícias de ``limpeza étnica" (atrocidades que incluem assassinatos, estupros e torturas, movidos apenas pelo ódio inter-racial).
Conheça a seguir a história de pessoas que tiveram sua vida modificada pela guerra.

SEPARAÇÃO FORÇADA
Após nove meses de casamento, Ramiza e Dzemal, bósnios muçulmanos, se separaram ao deixar Tuzla, fugindo da ocupação sérvia. Na última terça-feira, eles voltaram a se encontrar, por acaso, em um campo de refugiados, ao norte.
"Meu homem está comigo e eu estou muito feliz", diz Ramiza, 19, sob a tenda de plástico branco em que está abrigada junto com outros 6.000 refugiados, no aeroporto militar de Tuzla. "Antes éramos oito nesta tenda; agora que ele está aqui somos nove".
Dzemal, 22, pálido e traumatizado, conta que havia visto Ramiza pela última vez em 11 de julho, quando se uniu ao Exército que deixava a cidade, enquanto ela foi para o campo de refugiados.
"Eu sabia que seu pelotão vinha para cá, mas não sabia se ele estava vivo", conta Ramiza.
"Eu não tinha esperança de revê-la. Estava muito preocupado porque ouvi mulheres dizendo que foram pegas e estupradas, e temia que isso tivesse acontecido com Ramiza", lembra Dzemal.
O futuro, reconhecem, é incerto. "Vamos ficar aqui até que nos levem a outro lugar", diz ela.

A FUGA DOS SOLDADOS
O soldado bósnio Zulfo Mujanovic, 29, caminhou seis dias até chegar -salvo e bem de saúde- ao campo de refugiados de Tuzla. Ele tinha chegado a Kladanj, uma área do governo, e acabara de reencontrar sua família, que deixara Srebrenica havia três anos.
Mujanovic tem um filho de seis anos e uma filha de três, que ele nunca tinha visto. Ele ficou na cidade porque precisava defender o seu povo. A hora de partir chegou na última semana, quando Srebrenica estava prestes a cair.
Quantas das pessoas que começaram a marcha com eles chegariam é uma incógnita. Talvez metade, de acordo com relatos confiáveis. Muitos foram mortos em emboscadas sérvias e outros preferiram se matar a serem capturados.

SEPARAÇÃO E FUGA
Ifeta Hakic, 36, tinha quatro filhos -todos homens, com idades entre 6 e 16. Seu marido, Medo, trabalhava em uma madeireira de Srebrenica antes da guerra. No inverno de 92, temendo que a invasão sérvia fosse iminente, eles abandonaram sua casa de três quartos e se embrenharam na floresta. Voltaram logo depois.
Apesar de nem Medo nem seu filho servirem o Exército bósnio, acabariam presos pelos sérvios, por estarem em idade militar.
Ifeta partiu sozinha, na esperança de que seu marido e os filhos se unissem ao grupo que ia para o campo de refugiados. Na última quinta-feira, fazia oito dias que não tinha notícias dos

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sobre a Bósnia às págs. 23 e 24

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