São Paulo, segunda-feira, 24 de julho de 1995
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Reforma ameaça privilégios de juiz classista

FREDERICO VASCONCELOS; CRISTIANE PERINI LUCCHESI; SHIRLEY EMERICK; LUÍS FRANCISCO
EDITOR DO PAINEL S/A

CRISTIANE PERINI LUCCHESI
O Congresso deverá incluir nos debates sobre a reforma do Judiciário o fim dos privilégios aos juízes classistas.
A União gasta US$ 203 milhões por ano para sustentar esse disputado cabide de empregos e fonte de tráfico de influências.
São 2.344 ``magistrados" leigos, representando empregadores e empregados, que atuam como juízes a título de reduzir os conflitos entre o capital e o trabalho.
Desses juízes temporários não é exigido nenhum conhecimento jurídico. Basta que saibam assinar o nome. Mas eles têm os mesmos privilégios dos juízes de carreira, como aposentadoria especial e férias de 60 dias. Podem acumular os ganhos como membro da Justiça e a remuneração privada.
A questão é polêmica. Há especialistas que defendem a atuação do classista -com limitações- e há os que advogam sua extinção.
Levantamento do juiz togado Ronald Souza, da Bahia, revela que desde 1981 mais de 1.300 juízes classistas se aposentaram. Segundo ele, em mais de 53 anos de Justiça do Trabalho não há 200 juízes de carreira aposentados.
A Associação Nacional dos Juízes Classistas, com sede em Brasília, pretende barrar a revisão da aposentadoria especial da categoria na reforma constitucional.
O presidente da entidade, José Alceu Câmara Portocarrero, disse que confia na promessa de campanha de Fernando Henrique Cardoso, que defendeu os classistas.
Aposentado desde 1993, Portocarrero recebe R$ 6.200,00. Sua mulher, Maraíza Portocarrero, também foi classista, mas não pôde se aposentar como juíza.
Ele diz que, de 1,7 milhão de reclamações, 800 mil se transformaram em acordos e os classistas respondem por 80% dos acertos.
A extinção dos classistas permitiria contratar novos juízes de carreira, ampliando em 50% as Juntas de Conciliação e Julgamento, primeira instância da Justiça do Trabalho. Essas excelências não-togadas também desempenham o papel de juízes nos TRTs (tribunais regionais) e de ministros no TST (Tribunal Superior do Trabalho).
``A presença dos classistas no TST é desnecessária, pois o tribunal é eminentemente técnico. Eles poderiam funcionar exclusivamente nas juntas, preferencialmente remunerados pelos sindicatos", diz o ministro togado Almir Pazzianotto Pinto, do TST.
O advogado e professor de Direito do Trabalho da USP, Octávio Bueno Magano, vai mais longe. ``Um juiz classista não tem competência para ser juiz. Ao representar uma classe, ele não satisfaz um dos requisitos principais do juiz: a imparcialidade".
Para o ex-juiz do Trabalho e professor titular da USP, Amauri Mascaro Nascimento, ``se for suprimida a representação classista, a Justiça do Trabalho sofrerá um esvaziamento político e perderá suporte no movimento sindical".
A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) não tem posição definida. Mas entidades que congregam advogados e juízes articulam uma campanha, em Brasília, para acabar com a representação classista.
Proposta de emenda constitucional do deputado Humberto Costa (PT-PE) nesse sentido tem quase cem assinaturas (são necessárias 171 para tramitar no Congresso).
Na revisão constitucional de 1994, o então relator, Nelson Jobim (PMDB-RS), defendeu o fim dos classistas. Na subcomissão do Judiciário, o único voto pela extinção foi do ex-deputado Plínio de Arruda Sampaio (PT-SP).

Colaboraram SHIRLEY EMERICK, da Sucursal de Brasília, e LUÍS FRANCISCO, da Agência Folha em Salvador

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