São Paulo, terça-feira, 25 de julho de 1995 |
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Plus ça change...
ANDRÉ LARA REZENDE André Lara ResendeTerminei há pouco a leitura de ``Mauá, Empresário do Império". Hesitei antes de embarcar na empreitada. São quinhentas e lá vai fumaça páginas. Um tijolaço. Lembrei-me de um ex-amigo, economista, que, quando juntos no governo, após a enésima vez que lhe perguntei se tinha lido um determinado livro relevante para as questões do momento, perguntou-me quantas páginas tinha. Umas trezentas, respondi, curioso. Então não leio; mais de cem páginas só quando virar clássico. Pois sugiro que se abra uma exceção para o livro de Jorge Caldeira. Merece. Antes de mais nada impressiona a recorrência de nossos temas. O primeiro Banco do Brasil, fundado por d. João 6º, tratado como uma repartição, emitia sem lastro para emprestar ao governo. Os empréstimos e os juros eram pagos com novas emissões, mas os balanços contabilizavam gordos lucros com base nessas receitas fantasmas, e os acionistas privados recebiam os dividendos. A conta, é claro, ficava para os detentores de papel-moeda cujo poder de compra era reduzido pela inflação. Fechado o banco de d. João, o novo Banco do Brasil reapareceu verdadeiramente privado sob inspiração de Mauá. A proposta de criar um novo banco público não tardou. Proposto pelo próprio imperador d. Pedro 2º, encarregou-se o chefe do governo, visconde de Itaboraí, de lançar dúvidas sobre a solidez do banco de Mauá e defender o monopólio do banco a ser fundado. Houve tímida tentativa de defesa da existência de instituições privadas, da importância da concorrência, dos riscos de concentração de poder econômico. Venceu o governo todo poderoso. Mauá entregou os pontos, e seu banco foi encampado. A procura pelas ações do banco estatal foi maior do que a oferta. Solução? O ministro da Fazenda, marquês de Paraná, em conversas com o imperador, definiu a lista dos privilegiados. O banco de Mauá tinha 3 diretorias; encampado, passaram a ser 15. Primeira providência da nova diretoria foi cuidar do regimento interno e estabelecer os critérios pelos quais teriam direito de indicar apadrinhados. Antes mesmo de começar a funcionar resolveram comprar mais prédios. Fundações de funcionários ainda não tinham sido inventadas, mas seria curioso saber quem vendeu. Os defensores do monopólio do banco estatal eram adversários do progresso ``esteado no chão fofo das cédulas". Nostálgicos do padrão-ouro, cuja incapacidade de ser implantado aqui era fonte de permanente sentimento de inferioridade, o banco estatal era proposto em nome da disciplina monetária. No mínimo curioso. Mauá foi combatido por chefes de governo ``por estender os seus tentáculos sobre o Velho e o Novo Mundo, e mais se mais mundos houvesse". Como parlamentar defendeu a valorização do trabalho, a iniciativa privada e a busca do lucro. Foi tachado de argentário, especulador, acusado de ser movido pelo interesse privado e pela busca do lucro. Colecionou derrotas, provocou inveja e ressentimento. Jorge Caldeira apresenta um retrato talvez unidimensionalmente favorável do biografado. Viés comum, do qual ele parece estar consciente, ao reconhecer que talvez não tenha escapado da tentação de dar razão a Mauá. A biografia deste empresário de gênio é leitura obrigatória, se mais não for, pela sua atualidade. André Lara Resende escreve às terças-feiras nesta coluna. Texto Anterior: Não perder o trem Próximo Texto: O BOM; A RIVAL Índice |
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