São Paulo, quinta-feira, 27 de julho de 1995
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Os sem-terra também produzem

JOSÉ GOMES DA SILVA

A imagem que o grande público guarda dos chamados sem-terra se refere, principalmente, aos acampamentos de beira de estrada e às ocupações. Aqui, tanto eles quanto nós rechaçamos a palavra ``invasão", contando para isso com a boa companhia de juristas de nomeada, como Régis de Oliveira e Fábio Konder Comparato.
Na verdade, ``invadir" significa um ato de força para tomar alguma coisa de alguém, enquanto ``ocupar" diz respeito, simplesmente, a preencher um vazio, no caso, terras que não cumprem sua função social.
Doutrinariamente, a ocupação ganha ainda maior aceitação quando a população que a realiza está em estado de desespero, situação em que um direito natural maior -o direito à vida- se sobrepõe a um direito terreno como o direito de propriedade.
Uma outra incompreensão generalizada reside no significado econômico dos assentamentos controlados pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), uma organização que começou em 1982 no sudoeste do Paraná e que hoje está presente em 30 Estados do Brasil.
Os dados que se seguem permitem visualizar a preocupação do MST em dar viabilidade econômica a seus projetos, além, é claro, da simples posse da terra.
São 43 cooperativas de produção e cinco cooperativas regionais de comercialização espalhadas em oito Estados. Na capacitação de recursos humanos, o MST tem celebrado convênios com o Ministério de Trabalho e com o Departamento Nacional de Cooperativismo, além de cursos, seminários e diversas outras atividades didáticas organizadas pela Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (Concrab).
O Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária (Iterra) também foi montado em Veranópolis (RS), com o apoio da Congregação dos Capuchinhos local.
O sistema cooperativista dos assentados tem possibilitado grandes avanços na direção da transformação e beneficiamento da produção animal e vegetal. A unidade do Paraná, por exemplo, já possui seis unidades agroindustriais, processando milho, arroz, erva-mate e abate de animais.
No Espírito Santo funciona uma máquina de beneficiamento de café; no Rio Grande do Sul uma usina de leite e uma fábrica de embutidos, enquanto no Ceará e na Bahia já operam fábricas de farinha de mandioca, além de uma destilaria de aguardente. Buscando a diversificação, a Cooperunião montou no município de Dionísio Cerqueira (Santa Catarina) uma fábrica de jeans que já vende 800 peças por mês.
Os assentamentos do MST estão ainda ensaiando a plantação de caju e coco (em parte com irrigação) no Ceará, e a produção de alface em estufa e sementes de hortaliças no Rio Grande do Sul.
Não há como negar que essa preocupação com o ``econômico" está ajudando a elevar a renda familiar dos assentados para o nível de 3,7 salários mínimos mensais, conforme apurou a FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação) em pesquisa recente de âmbito nacional.

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