São Paulo, domingo, 30 de julho de 1995
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Psiquiatra auxilia civis refugiados na Bósnia

Libération
De Paris

MARC SEMO

A cada novo êxodo de refugiados que chegam a Tuzla, ela está lá em meio à multidão, despenteada e desvairada, fazendo perguntas a cada um que passa, à cata do menor indício de alguma informação. Sua vida consiste nessa espera e procura.
Originária de Vlasenica, 30 km ao sul de Srebrenica, no início da guerra perdeu duas netas, mortas por um obus. Seu marido e suas duas filhas adultas foram levadas para os campos sérvios.
Irfana Pasagic, professora de psiquiatria em Tuzla originária de Srebrenica se depara com ela continuamente há três anos.
"As pessoas acabam, pouco a pouco, por aceitar a morte de um ser querido", explica a psiquiatra, ``mas não existe nada pior do que a dúvida. Enquanto não têm a certeza da morte, certas mulheres se agarram à esperança, por mais improvável que possa ser, de que seu marido vá voltar alguma dia. Enquanto isso não acontece, não conseguem se reestruturar".
Na pequena barraca verde mobiliada com uma mesa e duas cadeiras dobráveis, uma mulher jovem fala em voz baixa, interrompida às vezes por soluços. Do outro lado da mesa, a socióloga e assistente social voluntária Harija Dizdarevic a ouve pacientemente.
Ela trabalha numa das seis barracas de "assistência psicológica" instaladas na base de Tuzla, o grande campo da ONU que até sua evacuação parcial, na última sexta-feira, abrigava cerca de 7.000 refugiados, quase todos mulheres, crianças e idosos expulsos de Srebrenica pelos sérvios na tomada do encrave, em 11 de julho.
Harija explica: ``Todas estas mulheres estão em estado de choque. De uma só vez perderam tudo, menos a vida".
``É a primeira vez desde o início da guerra que se faz uma operação tão ampla de assistência psicológica", afirma Jagoda Ungaro, psiquiatra croata que coordena essa missão do Alto Comissariado da ONU para Refugiados.
"As feridas mais profundas são aquelas que não se enxergam. Basta ver os olhares perdidos e desvairados dessas mulheres. São sofrimentos muito profundos, aos quais precisamos também propiciar uma resposta, além da assistência alimentar e humanitária convencional", enfatiza Monique Tuffelli, coordenadora.
A maior parte das mulheres que chegaram de Srebrenica era de refugiadas que, desde o início da guerra, vinham fugindo do avanço implacável das forças sérvias.

Tradução de Clara Allain

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