São Paulo, segunda-feira, 7 de agosto de 1995
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The winner is

WASHINGTON OLIVETTO

Como você deve saber, ou como minha pretensão imagina que você saiba, estive em Sydney, na Austrália, participando do Creative Imaging 95.
Voltei há 15 dias mas, como esta coluna sai de três em três semanas, só agora posso tocar no assunto.
Não vou falar do Creative Imaging, já que nesse tempo a mídia esgotou o tema, mas há um outro fato australiano que merece um pouquinho da sua atenção.
Todos nós, palestrantes no Creative Imaging, fomos também convidados para entregar os prêmios do The Australian Television Awards.
Fiquei impressionado.
O organizador do evento, Roy Bates, além de ser a cara do Tropeço, mordomo da Família Addams, é um inglês irritantemente perfeccionista.

Ensaio
Me obrigou a participar de um ensaio durante a tarde só para dizer "The winner is..." à noite. E eu até fiquei feliz pela perfeição do resultado final e particularmente por ele haver mantido o tradicional "The winner is ...", em vez de aderir à babaquíssima onda do politicamente correto, que inventou a infeliz expressão "The Oscar goes to ...".
O Australian Television Awards é uma festa de três horas, absolutamente perfeita, transmitida direto pela televisão australiana.
Premia o que de melhor foi produzido pela publicidade australiana e neozelandesa, igualzinho ao profissional do ano, da Rede Globo.
Só que este ano a televisão comercial está comemorando 20 anos na Austrália, e o que foi sempre uma grande festa nacional se transformou num gigantesco evento internacional.
Sem dúvida, o melhor momento foi o choro do rapaz que ganhou o prêmio de melhor fotografia ao receber seu troféu das mãos de Dean Cundey, fotógrafo do Spielberg, responsável por "Jurassic Park", "Back to the Future", "Gasparzinho" e muitos outros.
O moço quase teve uma coisa no palco, o que é plenamente justificável, já que para ele Deus e Dean Cundey são praticamente a mesma pessoa, com a diferença de que um se dedicou à religião e outro à fotografia de cinema.
Mas, fora esse adorável flash de pieguice, o que me chamou mesmo a atenção foi a qualidade da publicidade australiana.
Na Austrália, existe uma forte influência das publicidades inglesa e americana.

Propaganda fantasma
Por serem influências extremamente profissionais, a idéia da propaganda fantasma e de outras picaretagens sequer passa pela cabeça dos publicitários locais.
Para eles, ganhar um prêmio com uma peça inventada e não veiculada tem tanto mérito quanto ganhar uma corrida de cavalos pilotando uma moto.
Esse profissionalismo se reflete no todo do negócio.
Num país com apenas 17 milhões de habitantes, investe-se em publicidade um pouco mais de US$ 4 bilhões, um número parecido com o do Brasil de até pouco tempo atrás.
A televisão fica com mais ou menos 35% disso, mas está crescendo. Existem seis canais abertos na Austrália e a TV a cabo está começando.
As agências são esplendidamente remuneradas: uma conta de US$ 10 milhões como a da Gillette, que na semana em que eu estive lá trocou a McCann por uma agência local, deixa na agência uma receita de US$ 3 milhões, segundo a seção de negócios do jornal ``The Australian".
Concorrências por campanha praticamente não existem. As agências são escolhidas basicamente pelo seu retrospecto, e, se um anunciante mais inseguro quiser fazer uma concorrência por campanhas, deve chamar um máximo de três agências e remunerar as três de acordo com as normas da associação das agências, que regulamenta o negócio, e todo mundo respeita.
O trabalho em geral é de boa qualidade. Perde para a melhor publicidade brasileira em termos de criação, mas ganha na qualidade de produção, que custa preços parecidos com os nossos.

Absurdo
Vi trabalhos bons em praticamente todas as categorias, alguns excepcionais, e o vídeo com os premiados está comigo à disposição de quem se interessa pelo assunto.
Curiosamente, com tudo isso a Austrália não aparece entre os países mais premiados em Cannes, chegando sempre atrás de países como o Brasil, o que até tem certa lógica, e da Espanha, França e Itália, o que é um verdadeiro absurdo.
A razão é simples: os australianos se recusam a fazer filmes só para festivais, não participam de conchavos e por isso são violentamente garfados na decisão do "short list" do festival.
Na hora da premiação, ficam meio a pé, mas, por outro lado, como sabem que os clientes estão pouco se lixando para prêmios fajutos, dados por publicitários fajutos para trabalhos fajutos, mantêm com a maior dignidade o respeito dos clientes, a prosperidade do negócio e o carisma da profissão.
Antes de 1990, quando os fantasmas eram a exceção e o nível dos jurados era superior, a Austrália chegou a ganhar diversos Leões e até mesmo um Grand Prix com o maravilhoso filme Dear John, das fitas Basf, criado e produzido na Nova Zelândia, mas que para efeitos internacionais e para o The Australian Television Awards vale como australiano.

Delírio
Aliás, esse comercial, para mim um dos melhores de todos os tempos, foi apresentado num retrospecto do melhor da publicidade australiana nestes 20 anos, na abertura do The Australian Television Awards.
Na platéia, só um sujeito delirou mais com o filme que os publicitários australianos. E esse sujeito curiosamente era um brasileiro: eu.

P.S.: Sempre que você for à Austrália, não deixe de jantar no magnífico Forty One Restaurant, do chef Wendy Sawyere.
41º andar da Chifley Tower, Sydney. Telefone para reservas: (612) 221-2500.

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