São Paulo, segunda-feira, 7 de agosto de 1995
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Berkeley fez a bomba e o movimento pacifista

MARCELO PAIVA
COLUNISTA DA FOLHA

A história não pára. Vinte e cinco anos atrás é hoje. Está de volta o tema ``desaparecidos, luta armada, tortura e repressão". O debate agora é lúcido, sem as paixões da guerra suja, sem os rancores que a violência gerou, sem ódio do passado, talvez com arrependimentos e sentimentos de culpa.
O Brasil cresce com esse debate. O Brasil nos deixa orgulhosos. Perde o medo de deixar o esconderijo. Que coragem, a nossa, ao reabrir tais feridas, mesmo que elas tragam revelações dolorosas.
Com isso, o Brasil não faz outra coisa a não ser se conhecer, crescer, amadurecer e andar para a frente. Estou aliviado. E você?
Cinquenta anos atrás é hoje. A explosão da bomba de Hiroshima faz aniversário. E, a cada ano que passa, o ato é julgado e a necessidade de se jogar a bomba é reavaliada.
No início, diziam que a bomba apressou o fim da guerra, já que a invasão da principal ilha do Japão traria muitas baixas. A "bomba atômica salvara vidas", apesar de destruir duas cidades.
Hoje, sabe-se que a bomba atômica foi usada para parar os russos, que tinham acabado de declarar guerra contra o Japão. Os americanos não queriam dividir o Japão com os comunistas, como dividiam a Alemanha.
No mais, queriam testar o novo brinquedinho de US$ 2 bilhões (US$ 40 bilhões hoje), construído em um projeto que juntou os melhores físicos do ocidente, em instalações no deserto do Novo México.
A equipe que construiu a bomba foi a daqui de Berkeley, universidade que, depois, encabeçou a contracultura, o pacifismo. Ironia.
Na semana passada, o major Chuck Sweeney, piloto que voou nas missões que jogaram as duas bombas, decidiu falar.
Contou que, um ano antes de a bomba estar pronta, um grupo de pilotos já estava treinando para uma "missão secreta de uma bomba diferente. Declarou que, na verdade, não era Nagasaki o primeiro alvo, mas Kokura e que o mau tempo forçou-os a mudar.
Mas, diferente de Einstein, que disse que "o mundo não está preparado para armas nucleares", Sweeney reproduziu o discurso que agrada seus chefes: "Nós encurtamos a guerra".
Ele não aprendeu com a história. Mas a história que conta nos ensina. Azar dele. Sorte nossa.

MARCELO RUBENS PAIVA, 35, está nos EUA a convite da Universidade de Stanford.

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