São Paulo, segunda-feira, 7 de agosto de 1995
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Gravadoras decidem acabar com o jabaculê

DA REPORTAGEM LOCAL

As principais gravadoras do país decidiram pôr um ponto final na prática do jabaculê, ou ``jabá" -dinheiro pago às rádios para que essas toquem músicas escolhidas pelas gravadoras.
Manuel Camero, presidente da ABPD (Associação Brasileira de Produtores de Disco, que representa as seis principais gravadoras do país -Sony, PolyGram, WEA, BMG-Ariola, Som Livre e EMI) diz que as gravadoras pagavam regularmente às principais rádios do país para que veiculassem músicas escolhidas pelas gravadoras.
É a primeira vez que alguém do ramo admite a existência do jabaculê, ou ``jabá".
Camero afirma que o ``jabá" não é ilegal, mas reconhece que ``não é uma relação ética".
``As gravadoras estavam dando, a várias rádios, importâncias para que fossem feitos ``spots" (anúncios publicitários). Em contrapartida, as gravadoras eram aquinhoadas com a execução de suas músicas", diz Camero.
Para executar determinadas músicas, algumas rádios estavam cobrando em promoção ou em ``spot". ``Algumas rádios diziam que para executar tal música era preciso gastar determinada quantia", conta Camero.
Além de ``spots", o dinheiro entrava por meio de promoções, que, não raramente, incluiam viagens e carros.
Camero afirma que esse tipo de relacionamento envolvia a maioria das rádios das cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e das principais cidades do interior paulista.
Ele avalia que cada rádio recebia mensalmente R$ 10 mil por gravadora, em média, mas que as rádios mais importantes recebiam quantias superiores.
Camero afirma que, recentemente, o número de rádios que exigiam ``spots" e promoções cresceu, e o volume de dinheiro pedido aumentou.
``A culpa de tudo isso não é da rádio, é da gravadora. Ela comprava, antigamente, o disk-jóquei, digamos, por R$ 2 mil, que era barato. O dono da rádio viu aquilo e passou a querer a sua parte. Mudou a regra do jogo".
Segundo ele, algumas rádios mantinham uma entrada para o dinheiro das gravadoras nos seus orçamentos.
``Foi a oficialização do que acontecia antes, de uma maneira bem feita pelas rádios. Só que elas burramente extrapolaram", diz Camero.
Há dois meses, Camero foi procurado pelas gravadoras para dar um fim ao ``jabá".
Segundo ele, a suspensão do pagamento já foi tentada antes, mas é a primeira vez na história da indústria que todas as gravadoras acatam a decisão.
Responsáveis pela relação com as rádios, os diretores de marketing das gravadoras se reuniram na ABPD para decidir como o ``jabá" seria suspenso.
``A situação tinha chegado a ponto em que só havia verba para isso. Se continuasse assim era melhor contratar o homem da mala do que um profissional", afirma Camero.
Foi feita uma lista das 30 principais rádios AM e FM em São Paulo e no Rio, que, procuradas pela ABPD, foram avisadas que a compra de ``spots" e promoções estavam suspensas.
Procurados pela Folha, os diretores de marketing das gravadoras disseram que a ABPD é a porta-voz das gravadoras.
O último capítulo da briga de gravadoras e rádios ainda está longe. As gravadoras cogitam suspender a cessão gratuita de artistas para shows promovidos por rádios -algo que, segundo a ABPD, pode chegar, anualmente, a US$ 1 milhão por gravadora.
E a ABPD encomendou uma pesquisa ao Datafolha para definir quais são as rádios que mais influem o consumidor a comprar.
Isso vai ajudar a definir como a verba das gravadoras reservada para promoção será gasto daqui em diante.
``O percentual sobre a venda do disco para ser gasto na forma de promoção e marketing vai continuar a ser gasto. Mas, até agora, estava se gastando demais e de uma forma não muito profissional", avalia Camero.

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