São Paulo, segunda-feira, 7 de agosto de 1995
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Sempre contra a pena de morte

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Julgado de modo suspeito, o jornalista Abu-Jamal pode ser executado no dia 17
VICENTE PAULO DA SILVA
Está marcada para o dia 17 de agosto a execução do jornalista negro Mumia Abu-Jamal, condenado à morte, há 13 anos, nos Estados Unidos. Ativista do movimento negro, Wesley Cook -seu nome de registro, antes de se converter ao islamismo- foi condenado em um processo suspeito.
Assim como milhares de ativistas negros, intelectuais, políticos e defensores dos direitos humanos de todo o mundo, eu também enviei ao governador da Filadélfia, Thomas Ridge, telegrama pedindo pela vida do jornalista e contra a pena de morte.
A nossa central orientou a realização, no dia 9 de agosto, de atos e protestos diante dos consulados e da Embaixada dos Estados Unidos, juntamente com os integrantes do Fórum da Campanha ``Salve a vida do jornalista Mumia Abu-Jamal -Pelo fim da pena de morte racista".
Mumia Abu-Jamal, agora com 41 anos, foi militante do grupo Panteras Negras nos anos 70. Aos 13 anos, foi espancado e detido ao participar de um protesto contra o racismo no Alabama. Jornalista amplamente reconhecido desde 1970, foi eleito presidente da Seção de Filadélfia da Associação de Jornalistas Negros em 1980.
Segundo suas próprias palavras, sua militância anti-racista ``deu à minha caneta um caráter distintivamente antiautoritário e antiestablishment que continua até hoje". Como radialista, ficou conhecido como ``a voz dos sem vozes".
Em dezembro de 1981, foi acusado de matar a tiros um policial. No ano seguinte, em um julgamento de apenas quatro horas, foi condenado à morte por um corpo de jurados formado por 10 brancos e só 2 negros. O julgamento foi repleto de irregularidades.
As duas principais testemunhas de acusação estavam envolvidas em crimes e, por isso poderiam ter sido manipuladas pelas autoridades em seus depoimentos, em troca de imunidade em seus casos. Uma mulher, que assistiu ao crime, viu uma pessoa, que não era Abu-Jamal, sair correndo após os disparos que mataram o policial, mas seu depoimento não foi levado à corte.
E o exame de balística constatou que a bala fatal era de um revólver calibre 45, e a arma de Abu-Jamal era calibre 38. Mesmo assim, o juiz Albert Sabo, que já enviou 31 pessoas ao ``corredor da morte", condenou o líder negro. Sintomaticamente, das 31 pessoas condenadas pelo juiz Sabo, 29 são negras, latinas ou asiáticas.
Em uma carta enviada a brasileiros, no início deste ano, Mumia Abu-Jamal conta que ``desde a minha juventude eu tenho ouvido falar de Palmares e da sede de nosso povo por liberdade das correntes dos escravocratas brancos. Zumbi dos Palmares é um dos meus heróis".
Uma declaração significativa, partindo de um militante negro da América do Norte, nos 300 anos de imortalidade de nosso Zumbi. Como brasileiro, negro, amante da liberdade, da vida e da justiça, reitero uma vez mais meu pedido de reabertura do processo e cancelamento da execução de Abu-Jamal.
Reafirmo minha posição contra a pena de morte. Estou certo de que assim pensam também todos os que desejam um mundo solidário, sem discriminações, onde os direitos humanos sejam respeitados. No Brasil, embora a pena de morte não exista, infelizmente todos os dias são noticiadas execuções sumárias. É importante fazermos uma grande corrente em defesa da vida, aglutinando todas as pessoas de bem, independentemente de raça, credo ou posição social.

VICENTE PAULO DA SILVA, 39, metalúrgico, é presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Foi presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (1987-94).

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