São Paulo, quarta-feira, 9 de agosto de 1995
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Dólares demais

ANDRÉ LAHÓZ

As últimas semanas -e principalmente os últimos dias- estão sendo marcadas por uma entrada absurda de dinheiro do exterior. De fato, só neste mês quase US$ 2,5 bilhões ingressaram no país.
Ironicamente, apenas alguns meses após a crise mexicana a equação se inverteu e é absolutamente necessário estancar este fluxo de capitais. Chama a atenção, aliás, a lentidão do Banco Central para resolver a questão.
O maior problema de tantos dólares vindo para o Brasil está no custo, para o governo, de esterilizar este ingresso.
Ao ocorrer a troca de dólares por reais, há uma pressão sobre a base monetária. Para que não haja aumento de consumo -gerando pressão inflacionária-, o BC vende títulos no mercado para enxugar a liquidez.
Só que os dólares que o Banco Central passa a acumular rendem pouco. Os títulos públicos, ao contrário, custam muito caro para o governo.
Os problemas poderiam parar no custo da dívida pública. Teríamos aí uma bomba-relógio, que explodiria mais para frente. Mas há outras dúvidas no ar.
Por exemplo, não se sabe se, de fato, o BC consegue esterilizar todos os dólares que estão entrando. A base monetária em final de junho era de US$ 15,1 bilhões. O ingresso de capitais daí para frente foi de cerca de US$ 8,5 bilhões -ou 56% da base monetária.
Além disso, o aumento dos ativos bancários faz crescer a possibilidade de os bancos concederem empréstimos.
Não se argumenta aqui que a política de aperto monetário esteja em risco.
Dado o desaquecimento da economia, é até mesmo possível que estes reais que eventualmente não estejam sendo esterilizados pelo BC tragam um certo desafogo. É até mesmo possível que as autoridades monetárias contem com este crescimento da base.
Muito melhor do que arcar com o custo deste ingresso, no entanto, seria resolver o problema em sua origem.
Os dólares estão entrando por que a diferença entre juros internos e externos é muito alta. Além disso, a excelente operação na mudança da política cambial em junho devolveu tranquilidade ao investidor quanto ao câmbio.
Os juros primários podem cair mais -e certamente cairão nos meses que se seguem. Mas o Banco Central deveria sancionar esta queda o mais cedo possível.
Com isso, haveria menos dinheiro entrando no país -em que pese o interesse mundial pelo Brasil. O custo sobre a dívida pública seria menor.
Ao mesmo tempo, haveria um desafogo sobre a economia. Caso o governo não esteja convencido do desaquecimento da atividade econômica, poderia manter os compulsórios hoje pagos pelos bancos.
Uma outra alternativa seria impor restrições à entrada de dinheiro. Tanto a elevação da tributação sobre o capital quanto uma ``quarentena" (ou seja, a exigência que o dinheiro fique no Brasil por um prazo mínimo) caminham na mesma direção.
Teoricamente, o governo poderia ainda mexer na política cambial, mas isso não deve ocorrer.
A redução dos juros é a melhor solução porque toca na questão de fundo. Aumento do IOF ou quarentena atingem os resultados propostos, mas são mais um remendo.
O que é certo é que, como já há a clara percepção de que a entrada de dinheiro é exagerada e que alguma solução será tomada, os investidores aproveitarão cada dia a mais para internalizar seus dólares. A lentidão do governo é incompreensível.

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