São Paulo, quarta-feira, 9 de agosto de 1995
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Tráfico, a Hidra de Lerna

Primeiro foi o Cartel de Medellín. Agora, anuncia-se o fim iminente do Cartel de Cali. Se esses poderosos cartéis aos quais se atribuíram a quase totalidade da produção global de cocaína e crack podem ser tão facilmente destruídos, como se explica então que a oferta e o consumo de drogas só aumentem?
O tráfico se assemelha muito à Hidra de Lerna, o monstro da mitologia grega que possuía nove cabeças, uma das quais imortal. Hércules foi encarregado de ``aniquilar" a Hidra, mas para cada cabeça mortal que ele decepava, duas novas brotavam em seu lugar.
O semideus decidiu então atear fogo ao bicho e, por fim, cortou-lhe a cabeça imortal e a enterrou sob uma pesada pedra, onde ela teria permanecido vivíssima. A rigor, portanto, Hércules não matou a Hidra, ele apenas a ``varreu para debaixo do tapete".
No caso do tráfico, os cartéis são as cabeças mortais. Para cada uma ``destruída", surgem duas novas. A cabeça imortal é o todo-poderoso mercado, a demanda, o consumidor, o homem. E, enquanto o homem for homem, com seus impulsos dionisíacos e fragilidades bioquímicas, o flagelo das drogas tende a permanecer, sejam elas ilegais, como a cocaína e a heroína, ou legais, como o tabaco e o álcool.
Os bilhões de dólares gastos anualmente em todo o mundo na repressão ao tráfico são apenas uma cara tentativa de varrer o problema para debaixo do tapete. O que é uma pena.

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