São Paulo, sexta-feira, 11 de agosto de 1995
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Os metalúrgicos, as cotas e a política industrial automotiva

LUIZ MARINHO; CARLOS ALBERTO GRANA

LUIZ MARINHO e CARLOS ALBERTO GRANA
Nunca tivemos posição frontalmente contrária às importações de veículos e autopeças. A concorrência é importante para a redução de preços e melhoria da qualidade. Contudo, não aceitaremos jamais uma abertura sem critérios e controles, que leve à destruição da indústria nacional.
É claro que o movimento sindical não poderia deixar de alertar para a questão do emprego. Pesquisa do Dieese, de janeiro de 1995, concluiu que para cada conjunto de 16 carros importados verifica-se a perda de 4,3 postos de trabalho (sendo um posto nas montadoras e 3,3 no restante da cadeia produtiva).
Desde o início da câmara setorial temos apresentado propostas para a alavancagem do setor. Entre elas, enfatizamos a importância das cotas de importação, juntamente com exigências em termos de preços e qualidade para as montadoras internamente instaladas.
Todavia, a política neoliberal do governo, orientada pelas supostas vantagens do livre comércio, impediu tanto o governo de Itamar quanto o de FHC de levar em conta as nossas propostas.
Consequência: permanecendo o ritmo do primeiro quadrimestre, as importações de veículos poderiam chegar a mais de 30% da produção nacional em 1995; e a evasão anual de divisas com as importações de veículos alcançaria a mais de US$ 5 bilhões.
Não ocorreram inversões expressivas em novas plantas, apesar do forte crescimento da produção nos últimos três anos e meio; e os investimentos das multinacionais na América do Sul dirigiram-se prioritariamente para a Argentina, tendo em vista que nesse país existe um regime automotriz que concede uma série de incentivos às empresas.
E mais: a abertura sem qualquer controle de volume e tipo de peça tem levado a uma reestruturação selvagem no setor de autopeças. Acredita-se que desaparecerá um terço das empresas e haverá a eliminação de igual número de postos de trabalho no setor nos próximos anos.
Buscando intervir nesse processo, o nosso sindicato propõe:
a) a negociação tripartite quanto à regulamentação da medida provisória e quanto ao regime automotriz comum a ser negociado no âmbito do Mercosul;
b) a definição de uma relação de superávit na balança comercial de cada empresa participante do programa, na qual para cada dólar importado com os incentivos de redução da alíquota de importação sejam garantidos dois dólares de exportação adicionais.
A título de incentivo, poderá ser computado como exportação um percentual do gasto realizado pelas empresas com a compra de novos equipamentos e a expansão de novas unidades produtivas;
c) fixação do índice de conteúdo de autopeças nacionais no nível de 70% do valor total de peças utilizadas na fabricação de veículos por empresa;
d) novas montadoras poderão produzir com índice de nacionalização, passando gradativamente de 50% no primeiro ano para 55% no segundo ano, 60% no terceiro ano e 70% no quarto ano;
e) exigência de que no mínimo 60% das compras de máquinas e equipamentos novos feitas pelas empresas participantes do programa sejam de fabricação nacional;
f) fixação de cotas para os veículos importados, tanto para os independentes como para as montadoras internamente instaladas;
g) garantia do cumprimento, pelo conjunto do setor automotivo, da meta da produção (entre 2,5 e 3 milhões de veículos até o ano 2000), do incremento do nível de emprego e das demais cláusulas trabalhistas acordadas na câmara setorial;
h) abertura de linha de crédito especial junto aos órgãos públicos de financiamento -com o objetivo de promover a reestruturação do setor de autopeças-, condicionada à negociação quanto à organização no local de trabalho e à preservação do emprego.
É desse modo que, a nosso ver, a política industrial poderá criar condições para atender tanto os interesses das empresas como o dos trabalhadores e o dos consumidores; e a modernização será sinônimo de avanço e não seu contrário.

LUIZ MARINHO, 35, é vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.
CARLOS ALBERTO GRANA, 29, é secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

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