São Paulo, sábado, 12 de agosto de 1995
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Juízo arbitral pode simplificar o Judiciário

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

3.300 é a média de cidadãos que, todos os dias, inclusive no Natal e nos domingos, outorgam mandato a advogados autorizando-os a pedir que alguém seja citado, para responder a um processo em juízo.
Cada causa cível, submetida à máquina oficial, se junta a outras 2,5 milhões em andamento, percorrendo o longo caminho das sentenças de primeiro grau e dos recursos. Esperarão uns dois anos, em média, para serem julgados pela primeira vez. O julgamento aguardará mais uns quatro anos para ser reapreciado nos tribunais. Nunca menos. Isso sem falar nos recursos submetidos às cortes superiores.
O retrato da lentidão pode parecer trágico, mas a demora nem é o pior dos males. Pior é o desmantelamento da justiça civil do país, que põe em risco até a igualdade dos cidadãos perante a lei.
A descrição atormentadora é equilibrada e fiel, mas não deve assustar os brasileiros. Refere-se à Itália. Saiu, faz algum tempo, no jornal ``Il Sole - 24 Ore" e a anotei, como idéia para comparações com o Brasil. Só em São Paulo há 4 milhões de processos em andamento. O julgamento nos tribunais tende a tomar mais de um ano (às vezes dois, três), desde o protocolo até a publicação da decisão.
Profissionais jurídicos discutem métodos e meios para sairmos desse estado de coisas. As queixas italianas a respeito da justiça civil são as mesmas do Brasil, no que Vittorio Sgroi, procurador geral perante a Corte de Cassação italiana, chama de ``inútil repetição de um ritual cansativo e vazio". Assim também as carências humanas e materiais da justiça penal italiana.
Contrariando os hábitos dos governantes brasileiros, o vice-presidente Marco Maciel, em comentário nesta Folha, deu atenção ao Poder Judiciário e discutiu seu funcionamento. Constatou o paradoxo de que todos os programas políticos de modernização institucional se referem, ``em termos mais ou menos candentes, à necessidade de modernizarmos a Justiça brasileira". As providências efetivas, contudo, são poucas.
Marco Maciel quer diminuir o número de questões submetidas ao Judiciário. Lembra a arbitragem, um instrumento utilizado originariamente nas controvérsias entre nações, envolvendo questões de posse e domínio de territórios contestados.
O vice-presidente da República tira uma lição útil da verdade histórica. Para ele, se a mediação e a arbitragem podem ser ``viáveis, rápidas e exequíveis para os Estados, com muito mais razão podem ser eficazes e baratas para os particulares". Tem razão. Luiz Olavo Batista e José Carlos de Magalhães -dois autores brasileiros da área jurídica que têm dado atenção ao assunto- têm produzido sólida contribuição doutrinária a respeito.
Porque não se aplica a arbitragem? Há uma razão cultural: essa forma de resolver disputas é estranha aos nossos costumes e tradições. Segunda causa de desinteresse está na homologação obrigatória de todo laudo arbitral pelo Judiciário, o que, na ponderação de Maciel, elimina duas vantagens desse instituto: o sigilo e a celeridade.
O terceiro motivo pelo qual o arbitramento não ``entrou em moda" está em que o descumprimento do compromisso contratual da arbitragem se resolve em perdas e danos, a serem pagas pela parte culpada. Quem trabalha na área judicial sabe que a liquidação das perdas e danos demora anos.
Termino com o aspecto positivo: quando o vice-presidente da República sai de seus cuidados, para propor solução específica para a luta judiciária, não sei o que é maior, se a surpresa ou a satisfação.

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