São Paulo, domingo, 13 de agosto de 1995
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Bienal do Rio traz poucas novidades

DANIEL PIZA
DA REPORTAGEM LOCAL

A lista de lançamentos da 7ª Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro, que começa na próxima quarta-feira, conta com boa variedade de títulos de qualidade, mas o número deles não chega a ser expressivo (veja ao lado alguns destaques).
Há livros de que nenhuma biblioteca séria pode prescindir, como ``Poesia e Prosa", com o melhor de Charles Baudelaire, o poeta francês das ``Flores do Mal" e um crítico de arte, música e literatura bom nessas três modalidades.
Anote ainda três clássicos da filosofia: ``O Ser e o Nada", de Jean-Paul Sartre, em sua primeira tradução completa, ``Enciclopédia das Ciências Filosóficas", de Hegel, e ``O Ente e a Essência", de Tomás de Aquino. São obras centrais na reflexão de cada um.
Há algumas promessas de best sellers, como ``A Lentidão", o último romance de Milan ``A Insustentável Leveza do Ser" Kundera, e ``O Mundo de Sofia", de Jostein Gaarder, o livro que vendeu cerca de três milhões de exemplares no mundo, do qual esta Folha adiantou três capítulos.
Há publicações em outras áreas, como cinema e teatro, que, embora poucas, sem dúvida valem o investimento: ``Este É Orson Welles", o livro que o também cineasta Peter Bogdanovich preparou com entrevistas do diretor de ``Cidadão Kane"; e ``O Rinoceronte", a peça de Ionesco, um clássico da modernidade.
Na área de ensaios, dois volumes polêmicos sem os quais você não pode se dizer atualizado -duas das principais reflexões sobre a condição contemporânea- estarão à venda: ``A Rebelião das Elites", de Christopher Lasch, de que o Mais! publicou uma síntese em janeiro passado; e ``O Cânone Ocidental", de Harold Bloom.
Lasch argumenta contra o narcisismo, a falta de espírito público, das elites atuais. Bloom ataca os dogmas do chamado multiculturalismo, ora pregado pelas universidades americanas, onde as elites andam se embebendo de gororoba ideológica em vez do biscoito fino da cultura que fez Homero, Shakespeare e Kafka. A conexão não cabe só aos imaginosos.
No setor de biografias, memórias e cartas, o evento traz diversos títulos interessantes, entre os quais se destaca ``Entre Amigas - Correspondência entre Hannah Arendt e Mary McCarthy".
Trata-se de uma conversa fascinante entre duas das mulheres mais inteligentes do século. E olhe que Arendt -pensadora alemã, autora de ``Origens do Totalitarismo"- e McCarthy -romancista, crítica de arte e folclórica polemista americana- são personalidades quase antagônicas. (Pensando bem, talvez as mulheres se entendam melhor quando é assim.)
Outro destaque são as ``Memórias" de Voltaire, traduzidas pelo articulista da Folha Marcelo Coelho. Uma biografia do gênio iluminista (cujo tricentenário de nascimento ocorreu no ano passado), por Pierre Lepape, elogiada na França, também será lançada.
Outro francês biografado, mas este curiosamente esquecido (se bem que Voltaire teve uma comemoração injustamente morna em 1994), é André Malraux, romancista -autor de ``A Esperança" e ``A Condição Humana", livros que marcaram uma geração nos anos 40 e 50-, crítico de arte, ministro da cultura de De Gaulle, vibrante orador e homem de letras.
A biografia de Curtis Cate mostra Malraux em toda essa dimensão, mas seu ardor ideológico -hoje uma característica datada- parece tê-lo condenado ao oblívio.
Os setores mais pobres da lista são, sugestivamente, dois dos mais significativos para a saúde de uma cultura: ficção e poesia.
O romance brasileiro mais esperado -até por ausência de competição- é o primeiro de Zélia ``Anarquistas Graças a Deus" Gattai, intitulado ``Crônica de uma Namorada". Mas Gattai não pode ser exatamente chamada de escritora estreante, e a falta de novidades na área pode ser chamada de desanimadora.
Uma atenção especial, porque compensadora dessa pobreza, merecem alguns relançamentos das letras nacionais: os contos de Dyonélio Machado, ``Um Pobre Homem", primeiro livro do autor da obra-prima ``Os Ratos"; e ``A Carteira do meu Tio", um romance divertidamente atual de Joaquim Manuel Macedo, autor de ``A Moreninha".
Na poesia a paucidade é mais gritante. Destaca-se apenas um título: ``A Pupila do Zero", do argentino Olivério Girondo, um dos mais inquietos vanguardistas latino-americanos da primeira metade do século (leia resenha acima).
O balanço geral é o previsível: há uma qualidade média, mas longe de ideal. E até que, para os maus bocados por que o setor editorial vem passando (crise do papel, inadimplência de livrarias), o resultado é mais que satisfatório.

7ª Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro - Abertura para profissionais no dia 16, das 14h às 22h; abertura para o público no dia 18, das 17h às 22h. Até 27 de agosto (dias 19, 25 e 26, das 10h às 23h; dias 20 a 24 e 27, das 10h às 22h). Ingressos: R$ 1,50 (estudantes) e R$ 3. No Riocentro (Jacarepaguá, zona oeste)

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