São Paulo, domingo, 13 de agosto de 1995
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Brasil deve ser novo pólo do tráfico, dizem EUA

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BOGOTÁ

O embaixador dos EUA na Colômbia, Myles Frechette, diz estar "absolutamente convencido" de que, ante o cerco a que está submetido na Colômbia, ``o narcotráfico vai transferir seus laboratórios para os países vizinhos".
Por ``países vizinhos", entenda-se principalmente o Brasil.
Até porque Frechette dá outra informação importante: ``Já temos evidências de que os aviões que subiam do Peru e da Bolívia para a Colômbia, estão agora passando pelo espaço aéreo do Brasil".
Tais aviões carregam as folhas de coca, a matéria prima que, processada quimicamente, resulta na cocaína. Peru e Bolívia são os grandes pólos produtores da folha de coca. A Colômbia é o centro de processamento, onde ficam os laboratórios.
As declarações de Frechette à Folha foram feitas anteontem, na supervigiada embaixada americana no centro de Bogotá.
Frechette é a fonte ideal para tratar do assunto, porque conhece os dois lados. Foi cônsul em São Paulo até 1990, missão da qual resultou um português fluente, e está há um ano na Colômbia.
Passam por ele as informações provenientes da vigilância permanente sobre o tráfico que fazem as agências norte-americanas de informação (a CIA) e de combate às drogas (DEA).
A CIA e a DEA foram preciosas para o recente desmantelamento da cúpula do cartel de Cali, maior fornecedor de cocaína ao mundo.
Frechette prefere, em todo o caso, a modéstia. "A DEA e outras agências compartilham informações com a polícia colombiana, mas dizer que tudo isso aconteceu porque os EUA estão aqui não é verdade. Não são os norte-americanos que fazem as prisões", diz.
As autoridades brasileiras, conforme a Folha apurou, também suspeitam de que a máfia das drogas possa transferir pelo menos parte das operações da selva colombiana para a selva brasileira.
Por uma razão simples: a fronteira colombiano-brasileira, na Amazônia, é quase desabitada, com só uma cidade de porte razoável (Tabatinga), no lado brasileiro, vizinha à colombiana Letícia.
Se as previsões de Frechette e os temores do governo brasileiro se confirmarem, Brasil e Colômbia serão uma espécie de clones um do outro, guardadas as diferenças de tamanho (o Brasil é 7,5 vezes maior) e de população (há 4,5 vezes mais habitantes no Brasil).
Acusado pelo próprio tesoureiro de sua campanha eleitoral, Santiago Medina, de ter recebido dinheiro do narcotráfico, o presidente Ernesto Samper Pisano corre o risco de se transformar no Fernando Collor de Mello da Colômbia.
A Comissão de Acusações da Câmara de Deputados colombiana abriu, a pedido do próprio Samper, um processo semelhante ao do impeachment.
Como é mais conhecida como ```comissão de absolvições", é pouco provável que venha a propor o julgamento de Samper ao plenário da Câmara.
A menos que entre em ação outro ingrediente, a opinião pública, o que acentuaria a semelhança dos países. ``Sem caras-pintadas na rua, Samper fica", ouviu a Folha em círculos diplomáticos.
Até agora, não houve o mais leve sinal de que os jovens colombianos, como os brasileiros o fizeram há três anos, estejam a ponto de pintar os rostos para exigir a saída do presidente.
Mas, também como no Brasil do Collorgate, os colombianos vivem pendentes de novas revelações sobre o mais famoso número da história do país, o 8.000.
É o número que tomou inicialmente o processo que investiga a infiltração de dinheiro do narcotráfico nas campanhas eleitorais.

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