São Paulo, domingo, 20 de agosto de 1995
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Indicadores dos EUA driblam projeções

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O desempenho do mercado acionário dos EUA em 1995 tem sido espetacular. Puxada pelas ações dos setores tecnológicos e animada pela redução nos juros -que segundo os mais otimistas poderá continuar-, Wall Street vive um clima de perigosa euforia.
Como parece típico nesses momentos, os indicadores econômicos básicos, conhecidos como ``fundamentos", às vezes sugerem que tudo não passa de fogo fátuo.
O exemplo mais estonteante é o déficit comercial (importações acima das exportações). Os Estados Unidos registraram um déficit de US$ 11,3 bilhões em junho, número 2,4% superior ao de maio.
Não é por acaso que os japoneses investem cada vez mais na estratégia de transferir fábricas para as várias plataformas asiáticas. A economia americana continua funcionando como o maior sorvedouro de mercadorias do mundo. O foco da diplomacia econômica dos EUA dirigido para o Japão tem levado principalmente a esse deslocamento de exportadores para países ``em desenvolvimento".
Mas a estratégia dos japoneses, como a de outros tantos países que hoje buscam lugar ao sol da globalização, precisa ao mesmo tempo dar conta de outros indicadores da economia dos EUA que são, para dizer o mínimo, enganadores.
Afinal, os manuais de economia costumam sugerir que países com déficits comerciais crônicos geralmente acabam desvalorizando suas moedas. Mas o dólar, sustentado pela ação dos maiores bancos centrais do mundo, passou nos últimos dias por uma valorização tão surpreendente e rápida quanto a desvalorização de meses atrás.
Resultado: uma empresa exportadora japonesa que decidisse transferir fábricas para outros países ou mesmo para o interior dos EUA vê-se agora, novamente, beneficiada por um iene que se desvaloriza e, portanto, estimula a exportação a partir de uma plataforma no próprio Japão.
Assim, os movimentos de comércio, câmbio e investimentos diretos nos países desenvolvidos (e em certa medida também nos ditos ``em desenvolvimento") não contam hoje com referências estáveis por tempo suficiente.
Mesmo a performance da economia americana revela-se errática, enganosa. Assim, houve um desaquecimento da atividade nos EUA. As importações caíram. Mas as exportações caíram muito mais. O dólar afinal se valorizou e o dinamismo do resto do mundo deixa muito a desejar.
A economia japonesa está praticamente estagnada, os índices de desemprego europeus batem recordes sucessivos e até a China hoje desperta desconfianças crescentes.
Não é por acaso que as previsões de crescimento mundial têm passado por revisões para baixo nos últimos meses, enquanto as projeções de taxas cambiais foram recorrentemente dribladas pela realidade global.
Nos EUA, o ambiente de dúvidas sobre os ``fundamentos" complementa um início de desconfiança de que mesmo o ``boom" tecnológico tem um limite e que a euforia pode estar indo longe demais. No boca-a-boca do mercado e nas publicações voltadas ao enorme público investidor dos EUA, a velha lei da gravidade tem sido cada vez mais lembrada. Tudo o que sobe, desce. E o que sobe demais pode despencar.

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