São Paulo, quarta-feira, 23 de agosto de 1995
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General se opõe a projeto e deixa comando

EMANUEL NERI
DA REPORTAGEM LOCAL

Contrariado com o projeto do governo que prevê reconhecimento legal da morte de desaparecidos políticos e indenização a seus familiares, o general Murillo Neves Tavares da Silva, comandante da 7ª Região Militar do Nordeste, pediu transferência para a reserva.
O general discorda principalmente da indenização aos familiares. A Folha apurou que ele já havia manifestado sua insatisfação ao ministro do Exército, Zenildo de Lucena. Informou ao ministro que, para evitar atos de indisciplina, iria para a reserva.
O ministro atendeu ao pedido de Silva e o transferiu para a reserva remunerada, sem perdas salariais -um general-de-divisão ganha R$ 3.700 mensais. Anteontem, ele foi substituído interinamente pelo general Walter da Costa, comandante da 10ª Brigada de Infantaria Motorizada de Recife (PE).
A 7ª Região Militar, que tem sede em Recife, reúne os destacamentos do Exército de Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba e Alagoas. Está subordinada ao Comando Militar do Nordeste, que engloba todos os Estados nordestinos.
Maranhense, 58 anos, Silva ainda tinha sete anos de permanência na ativa do Exército. Um general fica 12 anos nessa condição. Silva tinha quatro anos como general-de-brigada e um como general-de-divisão. Podia ainda ser promovido a general-de-exército.
A Folha apurou que, além de Silva, outros militares também estão insatisfeitos com o projeto. Durante o regime militar (1964-1985), morreram 369 opositores do governo -152 são considerados até hoje desaparecidos.
A insatisfação militar preocupa o governo. Na última sexta-feira, o presidente Fernando Henrique Cardoso disse que o projeto não ultrapassará os limites da Lei de Anistia, de 1979. Ele falou para militares no 27º Batalhão de Infantaria Pára-Quedista, no Rio.
Antes, o ministro da Marinha, Mauro César Pereira, manifestou-se contra apuração de responsabilidades pelas mortes. Pediu ``muito cuidado" com o projeto porque, segundo ele, há ``muito desaparecido que está muito bem vivo por aí". Ele não citou o nome de qualquer pessoa nessa condição.
Em nota oficial, o Ministério do Exército disse ser contrário a ``qualquer investigação para apuração de responsabilidades" sobre as mortes, como querem os familiares. O episódio envolvendo o ex-comandante da 7ª Região Militar é a primeira manifestação de rebeldia contra o projeto do governo.
A Folha falou ontem com vários auxiliares do general. Eles confirmaram a insatisfação de Silva, mas pediram para que seus nomes não fossem revelados. O general considera revanchista o pagamento das indenizações aos familiares.
O general se queixa da omissão de militares na defesa da ação das Forças Armadas no regime militar. Um de seus auxiliares contou que Silva não perdoa alguns de seus colegas de farda que concordam com o projeto dos desaparecidos.

Colaborou RUI NOGUEIRA, coordenador de Produção da Sucursal de Brasília.

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