São Paulo, quarta-feira, 23 de agosto de 1995
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Militar quer destruir os documentos do arquivo do extinto Dops de Goiás

EMANUEL NERI
DA REPORTAGEM LOCAL

O general Luciano Thelante Casales, comandante militar do Planalto, está ameaçando destruir todo o arquivo do extinto Dops (Departamento de Ordem Política e Social) de Goiás.
Embora pertençam ao patrimônio de Goiás, os documentos foram entregues à 3ª Brigada de Infantaria Motorizada de Goiás em 1982. De lá para cá, o Exército tem-se recusado a devolver o arquivo ao Estado.
O grupo Tortura Nunca Mais de Goiás vai entrar com ação na Justiça para impedir a destruição dos documentos. O grupo reúne familiares de mortos e desaparecidos no regime militar (1964-1985).
Vai pedir ainda ao presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, Nilmário Miranda (PT-MG), que interceda junto ao governo para proibir que o general destrua os documentos.
A informação sobre a destruição dos arquivos foi dada pelo próprio general Casales ao jornal ``O Popular", de Goiânia, no último domingo. Ontem, o CMP (Comando Militar do Planalto) confirmou a informação.
A pedido do CMP, a Folha enviou fax reproduzindo declarações do general. O coronel Rudá de Almeida, assistente de Casales, enviou fax ao jornal dizendo que o general ``nada tem a acrescentar sobre o assunto tratado".
A 3ª Brigada de Infantaria Motorizada de Goiás é subordinada ao CMP, que tem sede em Brasília. Casales havia dito que os documentos são ``altamente sigilosos", mas que seriam destruídos por não terem interesse histórico.
O general afirmou ainda, na entrevista, que não lera o relatório sobre o conteúdo do arquivo do antigo Dops, mas que acredita haver apenas casos ligados a denúncias infundadas de corrupção.
``Não acredito que o arquivo tenha assuntos referentes aos desaparecidos", disse Casales. Ele discorda da versão dos familiares de que muitos dos desaparecidos estão enterrados na região Centro-Oeste, onde está Goiás.
Os arquivos do Dops de Goiás são um dos poucos do país que continuam inacessíveis aos familiares de mortos e desaparecidos. Documentos semelhantes de São Paulo, Rio e Minas já foram liberados para consultas.
Waldomiro Batista, do Tortura Nunca Mais de Goiás, acredita que a resistência dos militares se deva à existência de documentos sobre a guerrilha do Araguaia, movimento guerrilheiro ocorrido naquele Estado entre 1972 e 1974.

Guerrilha do Araguaia
A guerrilha era comandada pelo PC do B. Batista afirma que morreram no Araguaia pelo menos 70 das 80 pessoas desaparecidas no Estado. Quase a totalidade deles está na lista dos 152 desaparecidos políticos do país.
``Tudo leva a crer que alguma coisa de muito grave tem nesses arquivos", diz Batista. ``Por que os militares não permitem o acesso dos familiares goianos a esses documentos, como nos outros Estados?", questiona ele.
Os familiares tentam recuperar esses arquivos desde 1992, quando o Ministério Público de Goiás entrou com ação na Justiça pedindo a transferência dos documentos para o Estado.
No mesmo ano, a Procuradoria Geral da República alegou que o Ministério Público goiano não tinha competência para entrar com esse tipo de ação. Houve novo recurso, que está parado até agora no Tribunal Regional Federal.

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