São Paulo, quarta-feira, 23 de agosto de 1995
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A República da passeata

CARLOS ZVEIBIL

Poucas vezes na história recente do país governo e iniciativa privada estiveram tão sintonizados sobre o caminho a seguir no médio e longo prazo. Existem, é claro, controvérsias quanto à dosagem do ajustamento do Plano Real. As taxas de juros, para citar um caso, resvalam na pornografia. Mas ninguém discute que nosso futuro está em providências como a privatização, o fim dos monopólios e uma abertura maior ao capital estrangeiro.
Mas a sintonia existente, hoje, não é apenas entre o governo -que tem apresentado vitoriosamente suas propostas- e os empresários. A impressão que se tem, a julgar pelas pesquisas de opinião pública que vêm sendo divulgadas, é de que há também uma grande coincidência entre aquilo que a elite quer e o que pensam, em sua maioria, os brasileiros.
Assuntos que eram considerados verdadeiros tabus até pouco tempo -como a questão do capital estrangeiro, por exemplo- hoje são abordados com toda a naturalidade até pela esquerda.
Mas a lógica das ações coletivas é perversa. É muito pouco provável que um grupo de pessoas favoráveis à flexibilização da estabilidade do funcionalismo público saia de São Paulo ou do Rio, dirija-se a Brasília e estacione na frente do Congresso, exigindo mudanças. Assim como é quase impossível que uma caravana de brasileiros de qualquer parte do país vá ao Planalto Central para reivindicar a quebra do monopólio na navegação de cabotagem. Isso porque o envolvimento do cidadão comum com esses temas é mínimo.
Já as pessoas que são diretamente afetadas no processo -os próprios funcionários públicos ou aqueles que se beneficiam do monopólio- lutarão com unhas e dentes para que nada mude. Como a mídia se interessa pelo que é diferente e alguma arruaça é muito mais notícia do que os números de uma pesquisa, a sociedade fica com a impressão de que estão querendo acabar com o Brasil. A maioria está a favor das reformas, mostram os levantamentos. Mas parece o contrário.
É nesse ponto que a mobilização empresarial é importante. Os empresários não estão acostumados a "jogar para a torcida. Ao contrário, na Constituinte de 87/88 a esquerda conseguiu colocá-los como inimigos do povo e verdadeiros "traidores da pátria. O Diap -Departamento Intersindical de Ação Parlamentar- dava nota aos parlamentares. Quem votava naquilo que era considerado contrário aos interesses dos trabalhadores ganhava nota baixa. Os demagogos e populistas ganhavam nota dez.
Mas a situação há seis anos era bem outra. Para ``acertar as contas" com o regime militar, a Nova República achou de elaborar uma Constituição inexequível. Agora, tudo se transformou. Os "reacionários de ontem são os "modernos de hoje. Se houvesse um Diap da sociedade e do bom senso, as notas dadas em 87/88 estariam todas invertidas. Quem é mais avançado hoje? Roberto Campos ou Roberto Freire?
Os empresários precisam assumir a responsabilidade de ajudar a promover as reformas. A oportunidade que temos de mudar o Brasil é única. O mundo está indo -grande parte já foi- para o lado da eficiência, da privatização e do enxugamento do Estado. O governo quer isso, a sociedade quer isso e os parlamentares, pelo menos até agora, também.
Não faz sentido que nosso desenvolvimento seja freado por "passeatófilos, que, para não perder seus privilégios, passam à opinião pública idéias distorcidas sobre aquilo a que o governo se propõe. Estamos numa República democrática, não numa República da passeata. É tarefa dos empresários mostrar à opinião pública quem está do lado certo.

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