São Paulo, quinta-feira, 24 de agosto de 1995
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Tio Dave se diverte em The Hamptons

DAVID DREW ZINGG
EM THE HAMPTONS, NOVA YORK

Bem, Joãozinho, conseguimos! Chegamos aos célebres e imponentes Hamptons.
Quando digo que chegamos, amigão, estou falando apenas em sentido geográfico. Jornalistas de primeira geração têm mais ou menos tantas chances de serem aceitos pelos "glitterati" nesta elegante e esnobe cidade de praia quanto pulgas de serem bem-vindas nas calcinhas da rainha Elizabeth.
Este lugar está tão supercarregado de velhos ricos e novos hollywoodianos que você pensa que está assistindo a uma perpétua reprise do ``Fantástico".
A grande diferença aqui é que os atores e atrizes famosos estão vivos e ativos e você dá de cara com eles quando vai até a vila buscar seu jornal de manhã.
Vim aqui para ver os peixes graúdos. Isso porque The Hamptons fica no que possivelmente seja a mais cara extensão arenosa do mundo. Quando você pensa em comprar uma casa de praia por aqui, é bom lembrar que estará fora da jogada a não ser que seja, literalmente, dono de um banco. Um simpático barraco de madeira de dez quartos vai lhe custar um milhão de dólares por quarto.
É claro que esse tipo impensável de realidade verdadeira-falsa atrai artistas que fazem manchetes no mundo inteiro.
Barbra Streisand está presente em cada esquina. Toda vez que um desses bangalôs baratos de praia é colocado no mercado ela está ali para fazer uma oferta. Michael Jackson veio recentemente passar alguns dias na casa do Steve (estou falando de Steven Spielberg). Mas desconfio que isso não tenha ajudado muito seu casamento.
Este lugar já foi descrito como uma Manhattan sem pobres, ou uma Park Avenue com areia.
Você vai querer conhecer e ficar amigo de pessoas que têm quadras de tênis e/ou são sócias da Bathing Corporation.
Trata-se de um clube exclusivíssimo que luta para manter as praias livres daqueles infelizes que não possuem dinheiro antigo. Basta dizer que a Bathing Corporation conhece os fracos de seus sócios, donos de dinheiro antigo. No vestiário dos homens há uma plaquinha com os dizeres: ``Entrada proibida a menores de 12 anos".
Você também vai querer conhecer pessoas que alimentam outras pessoas, como Toni Ross e Jeff Salaway. Esses dois cavalheiros são proprietários de uma casa chamada, estranhamente, Nick and Toni's. Não posso contar como Toni conseguiu colocar seu nome na casa e Jeff, não, mas posso revelar que o "New York Times" jura que Salman Rushdie esteve aqui nesse verão, comendo e bebendo no Nick and Toni's.
O "New York Times", que costuma divulgar o que acontece nas altas rodas da Gringolândia, mandou um repórter para cá para checar a presença de Rushdie.
"Ele (Rushdie) se dispõe a arriscar sua vida por uma refeição em um lugar onde eu faria tudo para conseguir uma reserva para um sábado à noite", foi o espantado comentário do repórter.
Outra pessoa muito importante que se deve procurar conhecer em The Hamptons é um especialista no mal de Lyme. Trata-se de uma doença local transmitida por um bichinho, que faz você sentir que veio lá do Brasil só para contrair, de graça, uma dengue em estilo gringo. Pega-se essa doença lá fora, nos campos arenosos. Se você tiver o azar de pegá-la, uma coisa é certa, aposto: é a última vez que você vai tentar praticar ao ar livre seu esporte predileto, normalmente feito entre quatro paredes.
A brincadeira dos nomes
Este reduto praieiro quentíssimo tem mais frequentadores donos de grandes nomes do que os feijões na sua feijoada. É difícil dizer quem é a estrela deste ano, mas John-John Kennedy está fazendo um bom trabalho. Como eu contei no capítulo da semana passada, no mês que vem Kennedy vai lançar uma nova revista, "George".
Ele está na capa de metade das revistas em que se bate o olho e é frequentador habitual dos Hamptons. A parte engraçada é que John-John passou a maior parte de sua vida se escondendo da imprensa. Agora, se vê obrigado a procurar os mesmos odiados editores e implorar por um pouco de espaço.
É quase impossível descer até a vila sem parar numa fila ao lado de algum integrante dos Ricos e Famosos.
Entrei num estabelecimento famoso por seu sorvete de coco e dei de cara com uma cobertura extra para meu dia: Lauren Bacall à minha frente, também pedindo um sorvete. Eu não a via desde que nossos filhos atuaram juntos na peça de Natal da Buckley School, muitos anos atrás, mas disse oi. Ela olhou para mim, tentando lembrar quem era aquele estranho senhor de 70 anos. Respondeu com outro oi, ligeiramente perplexo.
Já desisti de vez de me tornar membro dos "glitterati", Joãozinho. Algo me diz que já estou um pouco velho para essa brincadeira.
Algo me diz que terei que abandonar meu sonho de vir para cá no ano que vem e alugar uma casa para passar o verão. Há pouco tempo uma casinha foi alugada em Gin Lane, batendo o recorde do verão: custou apenas US$ 250 mil. Por outro lado, talvez eu ainda consiga da Folha aquele aumento com que venho sonhando há tanto tempo.
É difícil manter a cabeça no lugar quando se está aqui: ela vive virando para ver essa ou aquela figurinha conhecida.
A proprietária do "Washington Post", Kay Graham, passou alguns dias aqui na casa da filha.
Jann Wenner, o recentemente oficializado publisher gay da "Rolling Stone", é figurinha constante no circuito das "barbeques". Barbeque, Joãozinho, é a palavra gringa que designa um churrasco untado com molho picante. Experimente mergulhar um pincel em molho e passar no churrasco -você vai gostar.
O Hampton dos escritores se chama Bridgehampton. Peter Maas (trabalhamos juntos na "Look"), Peter Mathiessen e Kurt Vonnegut estão passando férias aqui, pertinho de Caroline Kennedy.
East Hampton também tem alguns escritores de nome. Nora Ephron está aqui e também Clay Felker, o ex-editor da "Esquire" que co-inventou a escola do Novo Jornalismo, juntamente com sua mulher escritora, Gail Sheehy. Outro antigo colega da "Look", Joe Heller, também tem uma casa de verão aqui em East Hampton.
The Hamptons fica longe de Barretos, mas uma noite fui a uma festa que fez lembrar da Festa do Peão Boiadeiro. Estavam presentes algumas bichas enrustidas e algumas drag queens tresloucadas, estilo Ru Paul. Minha imaginação me levou até Barretos, onde devo estar amanhã à noite.
Se você puder ir a Barretos na sexta à noite, não deixe de ir. Um dos temas da festa que será realizada no Jóquei Clube é o aniversário da própria cidade. A outra razão para você ir a Barretos é que a partir das 23h da sexta, a capital brasileira do rodeio vai eleger a rainha da Festa do Peão Boiadeiro.
Mas atenção, historiadores, não passem por cima do detalhe mais importante: esse concurso vai eleger a Rainha do Peão Gay! Trata-se de um concurso honesto. Como diz o anúncio, "podem se inscrever transformistas maiores de todo o país, desde que não sejam siliconizados ou hormonizados, para que a ciência não coloque em desvantagem quem se transforma unicamente com a arte".
Aqui na Gringolândia existe um grande circuito nacional de rodeios gays. Esperemos que os organizadores de Barretos convidem os cowboys gays norte-americanos para a Festa do Peão de 1996.

Tradução de Clara Allain

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