São Paulo, sexta-feira, 25 de agosto de 1995
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A reforma tributária não é tímida

MAILSON DA NÓBREGA

A reforma tributária encaminhada ao Congresso é ampla e realista. Muitos devem, contudo, continuar tachando-a de tímida, principalmente tributaristas, economistas e empresários que fazem tábua rasa das dificuldades institucionais e políticas de um projeto dessa natureza.
As principais alterações sugeridas dizem respeito ao ICMS. A transformação do IPI em ICMS federal, outra novidade, eliminará livros para apuração do imposto, preparando o caminho para a fusão futura, inclusive com o ISS. Perde-se, contudo, muito do papel do IPI como instrumento de políticas seletivas conjunturais.
No ICMS, o governo ousou para valer. Propôs a desoneração integral das exportações e o fim da autonomia, introduzida pela Constituição de 1988, para os Estados aumentarem sua alíquota. Em benefício da harmonização tributária, da eficiência e da competitividade da economia nacional, essa competência voltaria ao Senado. Embora as novas regras só passem a vigorar em 1998, já se proibiria a elevação de alíquotas a partir do próximo ano.
As alíquotas do ICMS seriam uniformes sobre um mesmo bem ou serviço em todo o território nacional, eliminando o presente caos. Manter-se-ia, contudo, a existência de diferentes alíquotas para distintos produtos e serviços, dependendo de sua essencialidade. É o que há de melhor nas tendências internacionais mais recentes.
Cria-se a possibilidade de futura cobrança no destino. Elevaria a eficiência, embora exigisse mecanismo para evitar o potencial de sonegação, que aumentará ao se passar a cobrança da origem para o destino. Prevê-se também a possibilidade de a União arrecadar a operação interestadual. Possibilitaria, via formação de fundos, ações coordenadas de desenvolvimento econômico e social.
A União poderia instituir isenção de tributos estaduais e municipais quando previsto em tratado, convenção ou ato internacional de que o país seja signatário. É um passo para a futura harmonização tributária no Mercosul, difícil com as regras atuais.
A proposta vai requerer complexas negociações com Estados e municípios. Afinal, os fatores políticos e históricos que condicionaram o pacto federativo de 1988 se mantêm e são mais fortes do que normalmente se imagina.
Transformar substancialmente o sistema tributário é tarefa demorada em qualquer país. Tributo, antes de tudo, envolve poder. Não é a toa que as questões tributárias estiveram por trás de célebres eventos históricos: a Carta Magna inglesa, a Revolução Francesa, a independência dos Estados Unidos e a Inconfidência Mineira.
A complexidade é tamanha que o governo nem sequer abordou o tema das contribuições sociais, que abrangem cerca de 20 incidências em cascata. As principais -Cofins e Pis-Pasep- já representam mais do que a arrecadação líquida do IR e do IPI.
A frustração parece inevitável, principalmente porque o governo prometeu mudanças acima de suas forças. Esperavam-se a diminuição do número de tributos, a ampliação da base de incidência e a redução das alíquotas, inviáveis a curto prazo. Muitos desses objetivos podem ser alcançados paulatinamente, via legislação ordinária.
Seja como for, a proposta de emenda constitucional está longe de ser tímida. Enfrentará a resistência dos governadores, principalmente nas questões ligadas à limitada compensação pela desoneração nas exportações, à tributação no destino e à perda de autonomia para aumentar alíquotas.
O coro dos governadores poderá ser encorpado pela grita dos que confundem descentralização federativa (uma necessidade na política fiscal) com anarquia tributária e harmonização com centralismo autoritário.
O espaço não permite comentar outros aspectos da proposta, como o novo tratamento sugerido para o sigilo bancário e o retorno do empréstimo compulsório para absorção temporária de poder aquisitivo. Espero fazê-lo em breve.

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