São Paulo, segunda-feira, 28 de agosto de 1995
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Serra investe em mudança de imagem

GABRIELA WOLTHERS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O chefe da pasta do Planejamento, José Serra, conhecido no primeiro semestre como o ``ministro dos cortes" do Orçamento, tenta agora mudar sua imagem.
Num espaço de apenas 30 dias, liberou R$ 2,25 bilhões para obras de saneamento e habitação em 24 Estados.
Os restantes R$ 835,64 milhões foram distribuídos em solenidades realizadas em Brasília. Dentro ou fora do Distrito Federal, uma cena marcou todas as liberações: salas cheias de políticos -governadores, secretários, deputados e prefeitos.

Técnica e política
O ministro situa sua atividade na esfera técnica. No Congresso, porém, faz-se leitura diversa.
Sob reserva, parlamentares do PFL e do PMDB enxergam na atuação do ministro a busca de dividendos eleitoreiros. Serra é visto como potencial candidato à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Nos últimos 30 dias, em vez das reclamações pelos cortes, Serra tem ouvido aplausos entusiasmados, que se seguem a discursos nos quais anuncia as liberações de dinheiro.
``Esta é a primeira vez que recebemos verbas para investimentos do governo Fernando Henrique Cardoso", afirmou o prefeito de Goiânia, Darci Accorsi (PT), durante a assinatura do convênio para Goiás, no último dia 23, no Ministério do Planejamento.
``Antes, o ministro era conhecido como `moto-Serra', mas, agora, acho que chegou a hora de socializar os recursos", completou. ``Com o dinheirinho que o meu município vai receber, vou investir em rede de esgoto", disse o prefeito de Cristalina (GO), Gildomar Gonçalves (PP).
Segundo o governador de Goiás, Maguito Vilela (PMDB), cerca de 50 prefeitos e praticamente todos os deputados federais do Estado estavam presentes.
``Este é, a meu ver, o ministério mais importante do Brasil", discursou Vilela.
Ao investir no novo perfil, Serra tenta suavizar a imagem de austero irredutível, que lhe rendia desgaste junto aos políticos. Aposta agora num perfil de ministro preocupado com investimentos sociais.
No início do ano, o Ministério do Planejamento cortou R$ 3,2 bilhões do Orçamento da União. A poda atingiu principalmente emendas apresentadas por parlamentares.
Em seguida, foi anunciado que o governo poderia cortar mais R$ 9,5 bilhões ao longo do ano. A má repercussão da notícia fez com que Serra passasse a evitar comentários sobre cortes. Hoje, não trata mais do tema em público.
``O nosso objetivo é reduzir as despesas de custeio da máquina administrativa, não os recursos para investimentos, que são importantes para o crescimento do país", disse Serra à Folha.
A estratégia é mudar o enfoque que o noticiário dá ao ministério para retirar o assunto Orçamento da pauta e dar ênfase às áreas de saneamento e habitação, também sob responsabilidade de Serra.
``É claro que há um gesto político nas viagens que o ministro está fazendo. Se não houvesse, ele não precisaria sair de seu gabinete para assinar os convênios", disse o senador Francelino Pereira (PFL-MG), cujo Estado Serra visitou no último dia 11.
Além do governador de Minas, Eduardo Azeredo (PSDB), a solenidade no Palácio da Liberdade, para liberar recursos do FGTS, contou com a presença de secretários de Estado, deputados federais, estaduais, prefeitos e vereadores. ``Ficou lotado", afirmou o secretário de Habitação, Silvio Mitre.

Serra nega qualquer alteração de comportamento. Mas adotou um discurso político no desmentido. ``Minha taxa de pão-durismo não mudou. No dia 1º de setembro, será a mesma do dia 1O de janeiro ou do dia 1º de maio deste ano", disse o ministro.
Em seguida, não perde a oportunidade de fazer uma brincadeira com o presidente Fernando Henrique Cardoso: ``Refiro-me ao pão-durismo com o dinheiro público, que é dinheiro dos contribuintes. Agora, o Fernando Henrique é pão-duro ao quadrado, isto é, com dinheiro público e com o dinheiro dele mesmo".
``A linha de trabalho permanece a mesma", completa o ministro. ``Não houve obsessão de cortes nem afrouxamento na liberação de verbas", afirma.
Em São Paulo, Estado de origem de Serra, o convênio foi assinado em 25 de julho no Palácio dos Bandeirantes.
O auditório, com capacidade para 2.000 pessoas, estava cheio. Também participaram representantes de movimentos populares de habitação.
O prefeito de Campinas, José Roberto Magalhães Teixeira (PSDB), foi um dos que se deslocou de sua cidade para saudar a ``iniciativa" de Serra de liberar verbas para casas populares.

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