São Paulo, terça-feira, 29 de agosto de 1995
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Tiro no pé

JOSIAS DE SOUZA

BRASÍLIA - O Congresso discute o projeto de Lei de Patentes há quatro anos. Em linguagem simplista pode-se dizer que está em jogo o reconhecimento do direito de propriedade dos inventores sobre suas invenções.
Do ponto de vista do chamado grande público o debate comove tanto quanto uma partida de bocha. Há duas razões para tanto desinteresse: primeiro, o assunto é mesmo chato; depois, imagina-se que a protelação prejudique apenas a indústria americana, vítima da pirataria brasileira.
Quanto à chatice do tema, não há o que fazer. Difícil pedir ao cidadão comum que se emocione com expressões como ``pipeline" e ``licença compulsória". Mas convém cortar as asas da versão segundo a qual só aos Estados Unidos interessa a nova lei.
Veja-se, por exemplo, o constrangimento a que foi submetida a Embrapa. A empresa, vinculada ao Ministério da Agricultura, teve de registrar no Chile uma descoberta que fez no Brasil, em sociedade com a firma suíça Plant Genetic System.
Desenvolveu-se na Embrapa o processo de produção de um tipo de albumina que, em associação genética com o feijão, dá origem a um grão enriquecido. Esse não é um caso único. Há outro exemplo em Belo Horizonte.
Envolve uma empresa de propriedade do brasileiro Romeu Scarioli. Chama-se Biokits. Comercializa um produto que torna mais simples o diagnóstico da tuberculose, desenvolvido pelo cientista Luiz Erlon Araújo Rodrigues.
Para fugir dos piratas a Biokits teve de pedir o reconhecimento da propriedade intelectual de seu produto na França. O processo está em andamento. Romeu Scarioli planeja patentear a descoberta também nos Estados Unidos. A embaixada brasileira em Washington foi informada a respeito.
O projeto de Lei de Patentes empacou graças ao embate entre dois tipos de parlamentares: os xenófobos e os amigos das multinacionais. Encontram-se dos dois lados argumentos tolos e respeitáveis.
Da discussão poderia resultar uma lei que aproveitasse o que há de bom em cada um dos lados. É para isso que serve, afinal, o Congresso. Optou-se, porém, pelo pior caminho: a ausência de decisão.

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