São Paulo, sexta-feira, 1 de setembro de 1995
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Onde há barulho, não há fogo

JOSIAS DE SOUZA

Há problemas e problemas em Brasília. É preciso ter familiaridade com a rotina da capital para separar a dificuldade vira-lata, a complicação vagabunda, do contratempo real.
O aperto sem-vergonha é como o cão de rua. Pode latir muito, mas não morde, não produz prejuízos efetivos. Assim é a briga entre PSDB e PFL.
Ainda se rosnará muito de um lado e de outro. Os jornais torrarão parte de seu espaço com o arreganhar de dentes. Mas está longe, muito distante, o momento fatal, a hora da mordida.
O PFL não romperia com um governo em primeiro ano de mandato. É mais fácil macaco enjeitar banana. O rompimento só virá no ocaso. Ainda assim, se a popularidade de Fernando Henrique estiver rente ao meio-fio.
Ao governo também não interessa o rompimento. Não antes da aprovação de todas as reformas constitucionais. Fernando Henrique vai aturar por um bom tempo os resmungos do PFL. Ainda fará muitos jantares de conciliação à mesa do Alvorada.
E para que servem, afinal, os latidos que se ouvem na Esplanada dos Ministérios e na Praça dos Três Poderes? Servem para que o liberal PFL tente se reabilitar da recaída estatizante do Econômico e para que o neo-social PSDB preserve a fantasia de uma independência política impossível.
Falamos do falso problema e falta-nos o exemplo do obstáculo puro-sangue. Esse é como o câncer. Quanto menos se comenta, maior a sua gravidade. Há duas semanas Fernando Henrique reuniu um grupo de auxiliares, em segredo, para debater um obstáculo de boa cepa.
Tratou-se no encontro de um aumento de salário para os militares. Tão certo quanto o reajuste, já prometido aos ministros de farda, é o buraco que se abrirá nos cofres do governo.
O tamanho da fenda depende do percentual a ser definido. Os militares pedem 30%. A Fazenda tenta fechar em algo como 16%. Deve ficar em 20%. Buscam-se, de resto, fórmulas jurídicas que impeçam o funcionário civil de reivindicar o mesmo tratamento.
Em Brasília, a gravidade de um problema é inversamente proporcional ao barulho que se faz à sua volta, eis a conclusão inevitável.

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