São Paulo, sábado, 2 de setembro de 1995
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Mulheres querem transformar ideais em realidade

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Cerca de 40.000 mulheres visitantes discutem na China, em dois eventos, os grandes interesses da população feminina no mundo. Igualdade jurídica, condições de trabalho, educação, acesso ao poder e autodeterminação dos direitos reprodutivos são os temas para as organizações não governamentais e representantes de 185 países, sob o amparo da ONU (Organização das Nações Unidas).
O papa, ao despedir-se da delegação do Vaticano, recomendou responsabilidade e sensibilidade aos homens no tratamento das questões suscitáveis em Pequim, o que, na linguagem tradicional da igreja, corresponde a atitude que as lideranças femininas consideram conservadora e distante da realidade contemporânea.
Em termos ideais, as definições da Carta Brasileira de 88 são perfeitas. O artigo 1º diz que um dos fundamentos do Estado democrático de direito é a dignidade da pessoa de ambos os sexos. A igualdade genérica de todos perante a lei, na cabeça do artigo 5º, é confirmada no inciso primeiro ao dispor que "homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações.
No capítulo das relações do trabalho a Constituição traz o artigo 7º, cujo inciso 30 proíbe diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo.
No capítulo sobre a família se lê que os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. Se o leitor quiser conferir vá ao art. 226 da Carta de 88, no parágrafo 5º.
Ocorre, porém, que o próprio Congresso constituinte, no qual tais dispositivos foram escritos, era composto, em maioria, por homens. A mesa diretora dos trabalhos, relatores e relatores adjuntos eram homens. O exemplo histórico ilustra aspecto relevante dos direitos da mulher: apesar dos muitos progressos, há países nos quais ela ainda não atingiu condições de partilhar o exercício do Poder. O Brasil é um deles.
Há evolução. As profissões liberais passaram, nos últimos quarenta anos, por transformação substancial. A advocacia e a medicina, em especial, receberam profissionais qualificadas, chegando, em algumas faculdades, a superar o número de homens.
Todavia, o domínio masculino é evidente na docência universitária. No ensino primário e secundário, elas predominam. A evolução aponta no rumo do crescimento da participação feminina, cujo registro na pós-graduação, é particularmente auspicioso.
Contudo, há segmentos nos quais a participação das profissionais encontra resistência. Serve de exemplo, no Estado de São Paulo, o Poder Judiciário, no qual o Tribunal de Justiça não tem uma só desembargadora.
Os Tribunais de Alçada só em tempos recentes receberam as primeiras mulheres, as quais representam, contudo, menos de um por cento do total das nossas Cortes estaduais.
Nas relações privadas de trabalho, continua a discriminação salarial das mulheres, pois ganham menos que os homens. Não subsiste, porém, nas carreiras públicas, muito embora seja evidente o predomínio masculino no comando da administração.
Espera-se muito da reunião na China. O resultado principal, contudo, é fácil de indicar: trata-se de tornar concretos, efetivos, reais, certos preceitos enunciados nas leis e nas constituições, mas ainda distantes da vida diária.
Quando leis e realidade forem compatibilizadas, poderá dizer-se que homens e mulheres chegaram à igualdade, sem prejuízo do respeito de suas diferenças físicas e dos diferentes papéis que lhes cabem desempenhar em sociedade. Sem discriminação. Sem desníveis.

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