São Paulo, sábado, 2 de setembro de 1995
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"Assim, não dá"

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

É violência demais. Quem não se estarrece ao ler os relatórios sobre o conflito de Corumbiara (RO)? Não deveria haver a invasão da terra. Não foi legítima a hora da operação policial. Não se justifica o revide à bala, causando a morte do tenente. No entanto, de nenhum modo se pode aceitar a brutalidade da expulsão dos acampados.
Vários foram executados com requintes de perversidade. Mulheres e crianças sofreram fome, sede, ameaças e covardes agressões. Não se conhece ainda toda a gravidade desse evento inacreditável com 11 mortes e 53 feridos.
Há poucos dias faleceu o jovem vítima do confronto de torcidas organizadas no Pacaembu. Que tristeza ao ver os grupos se agredirem com paus e pedras! Um jogo comum de futebol transformou-se numa explosão selvagem de antagonismo e violência.
Nos mesmos dias, outro fato absurdo aconteceu. Membros de uma torcida, em Belo Horizonte, ao voltarem para o bairro, lançaram dentro do ônibus do clube rival uma bomba caseira, causando ferimentos graves.
Crescem os conflitos entre quadrilhas de rapazes armados que lutam e se enfrentam, com vandalismo, por pura competição de poder, agravada pelo álcool, uso e comércio de drogas. Tudo isso é constrangedor. Assim, não dá. Aonde nos levará tanta violência?
Sem dúvida, as autoridades hão de procurar os responsáveis por esses crimes, apurar a culpa e aplicar, com rigor, as penas previstas na lei.
É preciso ir mais longe e identificar as razões dessas brutalidades, para evitar que se repitam. Assim, no caso dos acampados, urge garantir o acesso a terras cultiváveis, agilizar uma eficiente política agrícola. Os policiais que executam a lei não podem exorbitar no exercício de sua missão.
Além disso, é inadiável que as decisões judiciais contemplem não só o direito de propriedade, mas o direito à integridade física, o respeito à pessoa humana, mais ainda quando está em questão o trabalho para a sobrevivência de famílias numerosas.
Quanto às torcidas, temos que pôr um freio, em tempo, ao eclodir de novos e maiores desatinos. Além do esforço constante para superar as injustiças sociais, há procedimentos que a sociedade brasileira deve assumir para debelar o mal pela raiz: a) antes de tudo, evitar a prática do aborto, hedionda violência contra um ser inocente e indefeso; b) no âmbito familiar, há que acabar com o hábito perverso de espancar os filhos. Pior ainda, o caso de estupros e violências sexuais contra menores no próprio lar; c) outro ponto é a redução na produção e venda de armas; d) acrescente-se o apelo aos meios de comunicação social. Nada justifica a projeção de filmes que incutem a tese de que o uso da força é que vence, apresentando cenas que aprovam roubos e assassinatos. É quase impossível educar crianças quando passam horas, cada dia, diante desse tipo de TV.
Outro ponto, de não menor importância, é a recente propaganda de lutas de boxe, nas quais derruba-se o adversário à força de golpes na cabeça, com perigo de morte. Não é esporte. É massacre. Assim, não dá. E como é que dá?
É preciso alimentar a esperança de convivência pacífica, solidária e amiga. Com a graça divina poderá acontecer pela educação ao respeito, estima e amor à pessoa humana, conforme a dignidade que Jesus Cristo a todos confere.

D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.

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