São Paulo, domingo, 3 de setembro de 1995
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Estratégia de sucessor na VR é armar contra-ataque

NELSON BLECHER
DA REPORTAGEM LOCAL

Adepto da prática de boxe, Cláudio Szajman, 26, não treina há um mês, assim como não tira férias há dois anos, época em que costuma esquiar na estação norte-americana de Aspen.
"A economia brasileira não deixa", diz ele com sorriso meio adolescente que parece combinar mais com seu temperamento que o austero terno azul-marinho e recortes do "The Wall Street Journal" cuidadosamente empilhados.
Mas de suas decisões, como ele próprio afirma, dependem 4.000 pessoas -os familiares dos mil funcionários da Vale Refeição (VR) que, fundada em 1977 pelo pai, Abram Szajman, projeta ultrapassar em 1995 o primeiro bilhão de dólares de faturamento.
"Jamais imaginei que um dia estaria diante de tamanha responsabilidade", diz Cláudio, que entrou na VR aos 18 anos, quando cursava economia no Mackenzie.
Em fevereiro de 1994, na partida de um processo sucessório, Cláudio e o irmão, André, 23, foram nomeados vice-presidentes. Cláudio comanda a área comercial. André zela pela administração e finanças da companhia.
Seguiu-se uma virada de mesa. "Demiti cinco diretores que trabalhavam há 10, 15 anos, desde a época em que a empresa ocupava uma sala", conta.
Hoje a sede se espalha por dois prédios que ocupam quase 8 mil m2 na zona sul de São Paulo. Também possui 28 filiais.
Segundo Cláudio, foi um período desgastante -"voltei a ter gastrite"-, mas necessário para consolidar o futuro da companhia.
Os veteranos foram substituídos por uma turma de executivos mais jovens -na faixa de 35 a 45 anos-, com cursos de pós-graduação e experiência em empresas do porte do Citibank e da IBM.
Empresas de serviços, acredita Cláudio, devem caminhar pelas infovias eletrônicas e utilizar "database" (banco de dados).
Por isso, o perfil de quem decide, segundo ele, deve ser de profissional orientado para o mercado, além de possuir habilidades para traduzir novas tecnologias em aplicações comerciais.
Hoje os executivos da VR se comunicam por correio eletrônico. Logo virão os "notebooks" para os vendedores.
Cláudio quer que a VR esteja entre as primeiras a promover videoconferências com filiais regionais, que serão viabilizadas pela instalação de microcâmeras nos terminais e comunicação em rede, quando houver cabos adequados.
Ele contratou os serviços da empresa de consultoria Forrester Research, de Boston (EUA), a mesma que aconselha gigantes da informática como a Compaq e a Lotus.
"Substituímos o sistema centralizado e fechado por uma plataforma cuja principal característica é a conectividade", diz Cláudio, de olho no potencial de negócios a serem gerados pela Internet.
O cotidiano do vice-presidente não se resume, porém, ao futuro cibernético. A VR, que imprime a cada ano 400 milhões de vales de refeição, passou a comercializar também cestas básicas.
Foi Cláudio quem esteve à frente das negociações com o parceiro Makro, que se prolongaram por seis meses. Era estratégico para a empresa criar esse novo produto, a fim de evitar que algum concorrente o oferecesse aos 9.200 clientes da VR, correndo ainda o risco de perder outros negócios.
Foram vendidas 35 mil cestas no bimestre de lançamento. A meta é atingir 230 mil até o fim de 1996. "Hoje, o mais difícil é prospectar clientes", diz Cláudio, ao comparar esse movimento ao de "esquiva" no boxe. "É quando o adversário tenta atacar mas não consegue atingi-lo. O contra-ataque é que vai definir a luta", explica. "No mundo dos negócios, o estilo demolidor de Mike Tyson está ultrapassado."
Patriarca e sucessores também se vacinaram contra o conflito de gerações e disputas entre parentes que têm provocado o desmonte de impérios familiares.
Desde crianças, Cláudio e André ouviam que sai mais barato dar mesada para sucessor inapetente do que mantê-lo na empresa.
"Meu pai não é de fazer média; se estou aqui é porque sou necessário", afirma Cláudio.
Ele diz não ter lembrança de episódios negativos -exceto os exageros de prolongar o expediente à mesa do jantar, o que motiva a bronca da mãe.
"Meu pai é muito liberal. Às vezes me espanta o tipo de liberdade que nos concede. Ou ele tem a visão de que fazemos a coisa certa ou comete um erro sério", brinca.
"Eles conquistaram suas posições e em breve terão novas responsabilidades", diz o empresário Abram Szajman, 56, presidente da VR e da Federação do Comércio do Estado de São Paulo.
Embora não pense em aposentadoria, Abram deve se dedicar ao planejamento de investimentos e deixar a operação aos filhos.
Com a reestruturação em curso, as empresas do grupo -que também possui um banco múltiplo, o BVR, e uma agência de turismo- serão agrupadas em holdings.
A nova estrutura vai definir a participação societária e cargos de Cláudio e André nas demais empresas. A caçula Carla, 21, estuda administração e, ao que tudo indica, irá se juntar aos irmãos.

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