São Paulo, domingo, 3 de setembro de 1995
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Brasileira é candidata na Alemanha

SILVIA BITTENCOURT
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE BERLIM

No próximo mês de outubro, uma brasileira poderá se tornar vereadora em Berlim, capital da Alemanha. A psicóloga carioca Maria de Fátima Barros Stollenwerk, de 46 anos, acaba de se naturalizar alemã para poder se candidatar pelo Partido Verde.
Há 16 anos no país, Stollenwerk desenvolve em Berlim atividades sociais com estrangeiros, idosos e crianças carentes.
"Não sabia que existiam tantas crianças mal tratadas aqui", disse. O trabalho social fez com que seus amigos a convencessem a entrar na política. "Foi um acaso".
Estrangeira e negra, Stollenwerk disse já ter sido vítima de racismo. Mas ela acredita que a eleição de uma negra para a Câmara de Vereadores de um dos distritos de Berlim poderá ajudar no combate à discriminação dos estrangeiros residentes na Alemanha.
O nome de Stollenwerk é o sétimo da lista do partido para a Câmara do distrito de Berlim-Schõneberg. Sua eleição está praticamente certa.
Em entrevista à Folha, concedida na sua casa, no centro de Berlim, Stollenwerk defendeu mais direitos aos refugiados da ex-Iugoslávia que vivem na Alemanha e criticou a imagem que a imprensa alemã apresenta do Brasil.

Folha - Como a sra. veio parar na Alemanha?
Maria de Fátima Barros Stollenwerk - Eu me apaixonei no Brasil por um alemão. Depois de um ano discutindo quem iria para o país do outro, decidi vir para cá.
Folha - O que a sra. já fez profissionalmente aqui?
Stollenwerk - Vim do Brasil com meu curso de psicologia incompleto e entrei na Universidade Livre de Berlim. Trabalhei por 13 anos em um asilo de idosos doentes mentais e depois em uma associação de casais binacionais.
Trabalho agora como psicóloga nessa instituição. Comecei também a trabalhar com menores carentes, o que foi uma surpresa para mim. Não sabia que existiam tantas crianças mal tratadas aqui.
Folha - Como a sra. ingressou no Partido Verde?
Stollenwerk - Foi um acaso. Uma amiga conhecia muitas atividades na área social e as minhas críticas. Ela me convidou para ocupar um cargo na Câmara dos Vereadores de Schõneberg, para ser uma espécie de porta-voz dos estrangeiros.
Fiz isso durante dois anos. Agora eles me pediram para me candidatar a vereadora. É pelo fato de eu conhecer muito a situação dos estrangeiros, sua situação legal, a opressão legalizada. No começo, não queria, mas eles insistiram tanto.
Folha - Por que a sra. não queria?
Stollenwerk - É muito trabalho e eu já trabalho bastante. Estou sempre ocupada. Tenho dias de 16 horas de trabalho. Às vezes, preciso de um tempo para mim.
Folha - A sra. é estrangeira e negra. Já foi vítima de racismo aqui?
Stollenwerk - Duas ou três vezes, em 16 anos, fui vítima de ataques verbais. Mas eram ataques muito pobres. O problema maior é que as leis protecionistas estão nas mãos de funcionários racistas.
Isso dói mais. Se você não conhece a base legal do país, você não consegue se defender e acaba acreditando naquela autoridade, que usa todas as proibições possíveis para não lhe dar oportunidade. Existe um racismo institucionalizado na Alemanha.
Folha - A eleição de estrangeiros pode mudar a situação?
Stollenwerk - Pode. Estamos jogando com as cartas do jogo deles. A sociedade alemã é orientada para a eficiência e os políticos de origem estrangeira são muito eficientes. Isso dá um respaldo para os outros estrangeiros.
Ajuda a evitar a comparação preconceituosa de que o estrangeiro vale menos.
Folha - Em que áreas a sra. pretende atuar, caso eleita?
Stollenwerk - Naquelas que já conheço. Na área de proteção ao idoso, que é tão mal tratado como qualquer minoria neste país, de proteção à mulher, à criança e, sobretudo, aos estrangeiros.

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