São Paulo, quinta-feira, 7 de setembro de 1995
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Mais dinheiro?

CID VELOSO

O ministro da Saúde, Adib Jatene, está colocando todo o seu prestígio e competência na árdua tarefa de conseguir mais recursos para a saúde.
É necessário, entretanto, alertar para um aspecto fundamental da questão: esse acréscimo orçamentário que está sendo pleiteado não produzirá nenhum impacto significativo sobre a saúde da população brasileira se não for mudado o modelo assistencial do país.
Para que haja um impacto verdadeiro sobre a saúde, é preciso investir maciçamente recursos e vontade política sobre a atenção básica, que atua sobre os fatores fundamentais da produção da maioria das doenças. Essa atenção prioriza a educação para a saúde, saneamento básico, alimentação adequada, vacinação, promoção da saúde materno-infantil, acompanhamento domiciliar de pacientes crônicos, vigilância sobre epidemias e endemias e outros procedimentos.
O Ministério da Saúde já iniciou a execução do Programa de Saúde da Família, que visa exatamente implementar essas ações. Esse programa precisa, agora, ser priorizado e reforçado.
Essas ações básicas são eficientes e de baixo custo. Alguns dados comprovam essa afirmação:
A) Recentemente, a Organização Mundial de Saúde avaliou que o soro oral caseiro, para reidratação infantil, já salvou mais vidas no mundo do que toda a tecnologia médica e todos medicamentos. B) Nos EUA, a incidência de doenças cardiovasculares decresceu 30% nos últimos 30 anos por causa das campanhas para reduzir a ingestão de gorduras animais, induzir o abandono do cigarro e estimular a atividade física. C) O ex-presidente da Fundação Nacional de Saúde declarou, no ano passado, que 65% das internações infantis no Brasil são devidas à falta de saneamento básico D) Relatório do UNICEF de 1990, mostra que houve redução de 32% da mortalidade infantil no Ceará em 3 anos, com ações básicas, das quais as mais importantes foram: estímulo ao aleitamento materno, reidratação oral e vacinação. E) Em saúde pública, há muito tempo está estabelecido que, para cada dólar que se investe em ações preventivas, economizam-se 20 dólares no tratamento de doenças.
É indubitável que o vertiginoso desenvolvimento tecnológico na área da saúde contribuiu fundamentalmente para diminuir as complicações das doenças e para prolongar e melhorar a qualidade de vida, mas não reduziu a incidência das doenças. A prioridade de aplicação de recursos orçamentários na saúde deve, portanto, ser dirigida para evitar as doenças e, com isso, diminuir a necessidade de internações, de cirurgias complexas, de tratamentos prolongados e de uso excessivo de equipamentos.
Realmente, o Brasil precisa de mais recursos orçamentários para a saúde, mas necessita urgentemente mudar o modelo assistencial. Se isso não for feito, mais dinheiro será jogado nesse "buraco negro da medicina assistencialista, sem nenhum impacto positivo real sobre a saúde.

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