São Paulo, domingo, 10 de setembro de 1995
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Fazendeiro de 4ª geração sonha com agroindústria

NELSON BLECHER
ENVIADO ESPECIAL A JABOTICABAL (SP)

O agrônomo paulista Paulo de Araújo Rodrigues, 27, passa metade do mês no município de Balsas (sul do Maranhão). Ali, na fazenda Serra Vermelha, que se estende por 12 mil hectares, ele supervisiona um projeto de produção de soja iniciado há um ano -joint venture das famílias Rodrigues e Aidar.
Na outra quinzena, Paulo, expoente da quarta geração de uma estirpe de agrônomos-fazendeiros diplomados na Escola Superior Luiz de Queiroz que se projetaram na política e associações de classe, dirige plantações de cana-de-açúcar, soja e laranja em Jaboticabal (345 km a noroeste de São Paulo).
Filho de Roberto Rodrigues, presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB) e neto de Antônio José Rodrigues Filho, que foi por duas vezes secretário de Agricultura e vice-governador de São Paulo na gestão Laudo Natel (1971-1975), Paulo não parece ter herdado a veia política dos antecessores.
Sim, ele acha importante participar de movimentos de classe, mas sem o grau de envolvimento do pai, que se dedica em tempo integral a essa atividade. Quanto a uma carreira política semelhante à do avô, nem pensar.
"Meu negócio é outro", diz ele, que sonha em detectar e explorar um nicho diferenciado da agroindústria capaz de agregar valor aos produtos agrícolas e, dessa forma, compensar os solavancos de preços típicos das commodities.
Com a ajuda do irmão Rodrigo, 21, que, para não fugir à regra, cursa agronomia na Luiz de Queiroz, meteu-se numa alquimia de testes para checar a viabilidade de produzir palmito de cana com sabor agradável.
"Calculo que o custo de produção seria três vezes inferior ao do palmito tradicional, graças à disponibilidade de matéria-prima", afirma. "Dois estudos científicos experimentais indicam existir essa possibilidade".
Ele também está de olho na produção de frutas. Podem estar a caminho mangas ou ameixas com a marca Santa Izabel. "Visitei, no Chile, uma das seis maiores indústrias mundiais de ameixa cujos pomares somam 1.800 hectares, área inferior à de nossos 2.540 hectares."
Com pé no chão, Paulo diz que esses projetos demoram até decolar. Mais breve será a transformação das propriedades familiares de uma sociedade de pessoas físicas em empresa, o que deve acelerar um processo de profissionalização em curso e evitar que as propriedades corram risco de serem pulverizadas.
"No Brasil, reforma agrária se faz na cama", brinca Paulo, ao se referir ao drama de fazendas que foram divididas, arcando com grandes custos operacionais, em consequência de contendas entre herdeiros. "O problema da agricultura é que, como não é você quem fixa o preço, só resta reduzir custos para lucrar. Para tanto é necessário economia de escala."
Uma das primeiras medidas que adotou ao ser promovido a superintendente, em janeiro passado, foi unificar a administração das quatro fazendas em torno de uma unidade de serviços.
A nova estrutura, segundo ele, facilitou a introdução de novos processos e a reduzir, de 89 para 44, o parque de máquinas. A receita colhida com a venda de tratores e veículos foi suficiente para financiar uma frota novinha em folha.
A área de cultivo rotativo de soja, praticado há duas décadas durante os intervalos do ciclo da cana, que ocorrem a cada cinco anos, cresceu seis vezes e atingiu 1.500 hectares graças ao arrendamento de terras ou parcerias com vizinhos proprietários.
Paulo conta ter tido apoio do pai para promover mudanças na administração. Mas confidencia que, no passado, agiu na moita para provar que uma idéia funcionava.
Contra a orientação paterna, construiu uma carroceria especial para substituir a carreta tracionada por trator por caminhão durante o plantio de cana. "Outras empresas já faziam isso. É mais eficiente".
Outra providência foi informatizar contabilidade e controles de produção em planilhas. Os quatro micros também são utilizados para a formulação de ração com custo mínimo e estratégias de locação de mão-de-obra. "A economia de custos atinge de 10% a 15%", calcula Paulo.
"A geração dele deve trazer grandes inovações, mas as condições financeiras para a prática da agricultura são tão adversas que se corre o risco de impedir os jovens de exercitar seu potencial".
Quem afirma é Roberto Rodrigues, sentado na varanda da casa da Santa Izabel, uma construção típica do início do século, projetada por Ramos de Azevedo, o arquiteto do Teatro Municipal de São Paulo.
É uma história antiga. Na crise de 1929, o bisavô de Paulo perdeu oito fazendas de café e pecuária.

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