São Paulo, domingo, 10 de setembro de 1995
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A recessiva venda recorde

JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Recessão estranha essa. Recessão à brasileira. Não é como a de 1983. Alguém se lembra?
Recessão com vendas recordes de carros e eletrodomésticos. Tem desemprego, mas cresce a massa salarial.
O Plano Real distribuiu renda. Tanto que -e é inegável- o padrão de consumo cresceu. E continua maior, mesmo hoje, do que o que prevalecia em, por exemplo, maio de 1994.
Qualquer plano ancorado no câmbio distribui renda, é expansionista.
Mas o México quebrou em dezembro, enquanto o Brasil, um iniciante nessa história, vivia o Natal da década e dos importados.
Com as torneiras de dólares fechadas, restou ao governo, para fazer sobreviver a âncora, reduzir o consumo e frear a economia.
O governo não dispunha do instrumento mais apropriado para fazê-lo -que é o fiscal. Usou os juros altos e o enxugamento do crédito.
Enfim, e esse é um problema dos instrumentos, o freio utilizado não tinha a sofisticação de um ABS. O carro da economia foi parado, travando rodas -não todas-, aos trancos.
Quem tinha ou tem acesso a crédito externo (com juros civilizados) escapou. Quem soube "casar" o chamado fluxo de caixa (renda, salários etc.) com os gastos, sem aumentar o endividamento, escapou. Quem não tinha ou não soube hoje paga a conta, mas é chamado de inadimplente.
Mas há ainda um outro processo em curso: o dos estoques. Há um problema físico aqui: a inércia, a resistência em modificar o estado de movimento.
Esse fenômeno fica visível nas importações. As vendas de carros apontaram para baixo em março, as importações caíram em finais de julho. O Porto de Vitória é o espelho da inércia.
Se sobraram importados (e não só carros), coube ao chamado produtor local a parte mais dura do ajuste entre oferta e capacidade de consumo.
É essa dinâmica que explica um quebra-cabeças que mistura as seguintes peças: demissões nas montadoras e nas indústrias de autopeças, 70 mil carros parados nos portos e vendas recordes de veículos.
Em algum momento, os estoques vão se esgotar. E a economia vai crescer. Depois, provavelmente, vamos começar a discutir como enfrentar o excesso de consumo... Será com juros altos? Ninguém mais vai falar em recessão.

Hoje, excepcionalmente, LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS não escreve esta coluna.

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