São Paulo, domingo, 10 de setembro de 1995
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Formas de contaminação são variadas

DANIEL PIZA; MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

A contaminação do entretenimento pela "alta cultura" se dá de maneiras cada vez mais variadas. Existem pelo menos cinco:
1- A citação glamourizante. Quando um clipe de Michael Jackson faz citações de expressionismo (o título, "Scream", é o mesmo da famosa tela de Munch, "O Grito") e surrealismo (telas de Magritte) -tendências estéticas que valorizam o inconsciente-, está falando dos instintos irreprimíveis do ser humano. Mas veste o lugar-comum de glamour cultural.
2- As biografias reducionistas. Estratégia preferida pelo cinema, as histórias das vidas conturbadas de gênios como Rodin, Eliot e Mozart os mostram como homens comuns, mesquinhos e até mesmo cruéis com seus semelhantes. Já sua obra não é interpretada, porque não pode ser caricaturizada.
3- O didatismo banalizador. São cada vez mais comuns os livros que pretendem explicar filosofia a adolescentes, mas se tornam best sellers também entre adultos. Como resultado, acabam substituindo a leitura das obras originais pela simplificação romanceada.
4- A apropriação estética. Filmes como o último de Woody Allen, "Mighty Aphrodite" (Poderosa Afrodite), que usa a estrutura narrativa do teatro grego, e peças como "Arcadia", em que o desenvolvimento dos personagens acompanha a evolução científica moderna (da ordenação do mundo newtoniano à descontinuidade da física quântica), se valem dos esquemas eruditos em sua estrutura.
5- Apoio dramático. Às vezes o personagem ou conceito da "alta cultura" é necessário para a própria credibilidade do enredo. Por exemplo: o fato de um "serial killer" ler obras filosóficas lhe empresta motivações "superiores".
Tal variedade de interferências entre culturas parece provar, ao menos, as teses da ensaísta americana Camille Paglia, autora de "Vamps & Tramps", sobre a herança da cultura tradicional presente na cultura pop. E a própria escritora é produto dessa contaminação. Não existem, em suma, mais refúgios à indústria cultural. A elite agora é pop.(DP e MR)

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