São Paulo, domingo, 10 de setembro de 1995
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Os novos viciados do sexo injetável

João (o nome é fictício) tem 18 anos e um vício. Na saída de um restaurante, na pista de dança ou mesmo no quarto, quando sente que o clima entre ele e sua namorada está esquentando, pede licença, diz que volta logo e vai ao banheiro.
Então, tira do bolso uma ampola, uma pequena seringa com uma agulhinha e injeta, na base de seu pênis, uma composição com a droga prostaglandina E1. O resultado é uma ereção que pode durar até três horas.
João não tem nenhum problema sexual. Mas é dependente do mais novo vício da praça: o sexo injetável. O fenômeno é crescente. Só no consultório do médico Malcom Montgomery, há 15 adolescentes se tratando para deixar o hábito.
Na clínica do andrologista Roberto Tullii, outros 15 procuram ajuda por mês. O terapeuta Moacir Costa também começa a receber cada vez mais usuários da agulha mágica.
"O fulano passa de eunuco para garanhão em segundos", diz Montgomery. "Aí mora o perigo". Segundo ele, drogas comuns, como álcool ou maconha, dão coragem, mas tiram a força física. "O problema dá prostaglandina é que ela dá os dois."
Os rapazes, geralmente de classe média alta, são encaminhados a Montgomery pelos pais, que descobrem a agulha nas coisas do filho. "Explico que é uma droga lícita e o vício não é físico", mas psicológico.
No início, a prostaglandina era a base de um remédio receitado para recém-nascidos com anomalias cardíacas. Há 15 anos, descobriu-se que, diluída em água e injetada no pênis, provocava ereção imediata.
Foi rapidamente adotada. É perfeita para determinar se a impotência do paciente é física (aí, a droga não faz efeito) ou psicológica. Auxilia ainda pessoas com ejaculação precoce ou muito ansiosas.
"Agora, rapazes perfeitamente normais usam a primeira vez, de farra, e depois não conseguem mais transar sem aquela garantia de ereção", diz Tullii. A dependência vem da certeza do sucesso. "É o sonho de todo macho", concorda Moacir Costa.
"Os meninos me falam: 'Pra que a gente vai ficar esquentando a cabeça se vai ficar de pau duro, conseguir dar três ou quatro numa noite, esperar a menina gozar, se a injeção resolve tudo?'", diz Montgomery.
Necrose no pênis
"A prostaglandina deve ser ministrada eventualmente, em pacientes com problemas, duas vezes por semana", diz Tullii. "Mas o pessoal injeta todo dia, por conta própria, afirma Montgomery. Então, surgem os efeitos colaterais. O mais comum é a fibrose (degeneração do tecido).
Outro efeito, mais grave, é o priapismo (ereção prolongada). Em cerca de 5% dos usuários, há o risco de a droga fazer efeito por dez horas ou mais. "Além de ser muito dolorido, pode necrosar o pênis", diz Tullii.
Nesse casos, o médico tem de injetar adrenalina no pênis. Se não funcionar, injeta uma agulha na veia dorsal do órgão para drenar o sangue-extra. Persistindo a ereção, faz um corte na base do pênis, deixando o sangue correr. Esse último passo pode causar impotência perene.
"Os adolescentes desconhecem isso", acredita Tullii. "Ou porque compram de médicos picaretas, ou porque encomendam direto de farmácias suspeitas em Miami". Atualmente, a prostaglandina não é vendida em farmácias no Brasil.
A Revista da Folha apurou, no entanto, que a droga pode ser facilmente encontrada, seguindo anúncios de revistas pornográficas ou placas no centro da cidade com os dizeres "Cura-se Impotência". No mercado paralelo, a ampola preparada, com uma dose, custa R$ 230.
"E, a partir deste mês, a coisa vai pegar", diz Tullii. É que o laboratório Upjohn espera autorização do Ministério da Saúde para lançar o Caverject -a droga já destilada, pronta para uso. Será vendido nas farmácias, só com receita. "Mas estamos no Brasil', ironiza Tullii.

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