São Paulo, quarta-feira, 13 de setembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Sinal vermelho

O perigo de que uma conduta anormal, alimentada pela impunidade, acabe se repetindo no cotidiano até ser tomada como normal pode ser exemplificado pela contumaz obstrução dos cruzamentos de ruas nas grandes cidades brasileiras, com a qual muitos já se resignaram a ter de conviver.
A paisagem grotesca, cuja gravidade é intensificada pela heróica tentativa dos pedestres de atravessar a rua pela faixa que lhes é reservada, contornando os carros que a invadiram, poderá ser apagada pelo menos do cenário paulistano se a prefeitura da capital de fato executar com inflexibilidade a tarefa, iniciada nesta semana, de multar os motoristas que diariamente perpetram essa aberração nas principais esquinas da cidade.
Aquele que, valendo-se da ostensiva desigualdade entre o metálico poder da máquina e a fragilidade do corpo humano, vê-se no direito de afrontar as regras mais básicas de coexistência no espaço urbano, mostra-se lamentavelmente contaminado pelo automatismo da máquina que pretende domar.
Os pedestres, por sua vez, achincalhados em sua integridade pessoal, parecem fazer desta uma causa perdida, pouco respeitando o espaço que lhes cabe nas calçadas. São o outro lado da inflacionada moeda com que se paga o preço da mais completa incúria.
A principal tarefa, de caráter cultural, parece ser a de se formar uma postura natural de respeito aos limites da vida pública, ainda que estimulada inicialmente apenas pela fiscalização do Estado e dos cidadãos uns pelos outros.

Texto Anterior: No free lunch
Próximo Texto: De vícios e virtudes
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.