São Paulo, quinta-feira, 14 de setembro de 1995
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Nova York possui o dom da vitalidade

DO "LE MONDE"

Quem chega à cidade se lembra dos primeiros minutos de "Manhattan", de Woody Allen, quando sua voz em "off" tenta dar uma definição de Nova York, explicar porque ele ama tanto essa cidade -mas acaba por passar a "palavra" ao clarinete de "Rhapsody in Blue", de Gershwin, que diz mais sobre o assunto do que qualquer livro.
A impressão que se tem ao chegar a Nova York é sempre a mesma, mesmo quando se chega pela centésima vez, acreditando conhecê-la bem. Tem sempre alguma coisa nova, que surpreende.
Sua vitalidade é espantosa e ela nos fascina com seu misto de tijolos antigos, de ruínas jovens e arranha-céus cintilantes, suas multidões apressadas, seus táxis amarelos, os jatos de ar quente que escapam da calçada como suspiros de monstros industriais trabalhando ocultos sob o asfalto, nas bases das grandes cúpulas de aço e vidro dos arranha-céus que nunca dormem, nunca param de empurrar antenas para o alto no céu noturno.
Dizem que Nova York é uma cidade em pé. É uma bela imagem que ocorre espontaneamente ao viajante que a vê pela primeira vez desde o mar ou desde a estrada que atravessa Long Island, tanto sua silhueta contra o céu (que os americanos chamam, justamente, de "skyline") é altiva, ereta, tanto ela transmite orgulho e ambição, entusiasmo urbano e loucura pela altura.
Aliás, Nova York é uma cidade tão em pé que ela nunca deixa ninguém se sentar. Não existem bancos nas ruas; não há muretas mais largas que não sejam coroadas por grades de ferro.
Há 20 anos a "Grande Maçã" ia de vento em popa. Depois veio a crise econômica e a Aids. Muitos artistas desapareceram e Nova York foi decretada "out" por excesso de estresse, criminalidade, sujeira e baixo-astral.
Hoje, porém, dizem que tudo isso deixou de ter importância. Os nova-iorquinos de sempre, os indestrutíveis, nunca duvidaram disso e voltam a proclamar a glória de sua cidade.
Chegou-se até a falar na possível mudança de alguns californianos ilustres para cá -o diretor Steven Spielberg, por exemplo, cujo nome foi citado seriamente, desmentiu.
Spielberg em Nova York não seria uma simples mudança: seria uma revolução. Pois grande parte da história dos EUA e toda a história de seu cinema se desenrola em cima da rivalidade dessas duas costas, Leste e Oeste, entre Nova York e Los Angeles, a cidade em pé e a cidade deitada.
Historicamente, tudo começou em Nova York, praticamente ao mesmo tempo que em Lyon.
Sem querer lançar uma vã discussão sobre a paternidade do cinema -tanto mais porque é claro que ela pertence aos irmãos Lumière-, é preciso admitir que na mesma época que eles, Thomas Edison já estava bastante avançado em seus trabalhos.
Ele havia adquirido a patente do Vitascope, uma espécie de "peeping machine", de caixinha para espectador individual, na qual se introduzia uma peça para olhar as imagens por uma fenda.
Os Latham haviam aberto uma sala para projetar curta-metragens sobre boxe, e Richard Koszarski, responsável pelas coleções e exposições do American Museum of the Moving Image (AMMI), considera que eles foram, portanto, os primeiros, antes dos irmãos Lumière, cujo nome não cita.
Já desde o final dos anos 1880, na verdade, Edison vinha pensando em uma máquina "que faria para os olhos o que o fonógrafo fez para os ouvidos".
Ele vivia e trabalhava perto de Nova York, em West Orange, no estado de Nova Jersey, onde instalou seu estúdio -um hangar pintado de preto e batizado Black Maria, que foi posteriormente reconstruído para ser visitado por turistas, embora na realidade não haja muita coisa a ser vista no local.
A vantagem é que ficava pertinho de Nova York, onde ele abriu um segundo estúdio, na rua 20, para as cenas de interiores. As externas eram filmadas no subúrbio vazio de Nova Jersey.
É impossível superestimar a influência da geografia e do clima sobre o cinema. No início do século, os teatros de comédia musical eram situados em circuitos que seguiam as linhas das estradas de ferro, convergindo para a região de Manhattan.
Um espetáculo novo era sempre lançado em Nova York. Se fizesse sucesso, a notícia se espalhava por meio do trem e chegava ao país inteiro. Essa tradição se conservou e um espetáculo que não tiver sido apresentado em Manhattan não terá sido apresentado.

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Sobre o cinema em Nova York nas págs. 6-19 e 6-20

Tradução de Clara Allain

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