São Paulo, sexta-feira, 22 de setembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O uso de anabolizantes no país

JOÃO PALERMO-NETO

Alguns assuntos tornam-se polêmicos quando a verdade sobre eles não é conhecida. Os anabolizantes enquadram-se nesse grupo. Muito se tem dito sobre essas substâncias, que representam uma inovação tecnológica de ponta que a farmacologia colocou à disposição da pecuária de corte. Poucos, no entanto, são aqueles que se cercam do cuidado e da realidade científica para suas informações, considerações e divulgações.
O Maara (Ministério da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária), atendendo a solicitação emanada do Congresso Nacional, criou em 1994 uma comissão de especialistas para discutir as questões relativas ao uso de anabolizantes, inclusive a proibição de seu emprego no território nacional. Atuou, portanto de forma ética, transparente e séria.
Ainda estuda essa questão, entre outros fatos, à luz das conclusões do trabalho da comissão.
São elas: 1) os promotores de crescimento de ação anabólica proporcionam aumento na produtividade pecuária, representando importante ferramenta tecnológica; 2) poderão ser liberados no país os anabolizantes ditos naturais (estrógeno, progesterona e testosterona), bem como os chamados xenobióticos (zeranol e trembolona), desde que os animais sejam adequadamente tratados.
3) O uso dos estilbenes (DES-dietilestilbestrol) deverá continuar proibido em todo o território nacional; 4) a venda dos anabolizantes deverá ser feita diretamente ao produtor rural, através de receituário de médico veterinário.
5) Credenciar laboratórios de análise de resíduos nas instituições públicas para, juntamente com o Lanara (Laboratório Nacional de Referência Animal), realizar o controle periódico de resíduos de anabolizantes em carne bovina destinada à exportação e ao consumo interno.
6) Deverão ser adotados, no tocante à carne destinada aos países da União Européia, os mesmos critérios por eles aprovados e em vigor na Argentina. Com relação a esse fato, nunca é demais lembrar que o Brasil é membro do Mercosul e que, portanto, deverá encontrar formas corretas e idênticas de tratar dos mesmos assuntos.
No presente momento, uma comissão conjunta de especialistas -formada pelas secretarias de Defesa Agropecuária e de Vigilância Sanitária dos ministérios da Agricultura e da Saúde, respectivamente- estuda em detalhes alguns pontos considerados relevantes para que se possa decidir, em definitivo, sobre a liberação ou não do uso de anabolizantes no país.
Sobre esse assunto, parece-nos importante lembrar a máxima primária da toxicologia: "não existem substâncias químicas seguras; existem formas seguras de se utilizar das substâncias químicas.
Em outras palavras, toda substância (natural ou sintética) é potencialmente tóxica; a possibilidade da ocorrência de efeitos indesejáveis depende de diversos fatores, dentre os quais destacamos a via de administração, a dose administrada e o tipo de substância usada.
No relatório acima mencionado, cerca de 125 artigos atuais, publicados em diferentes revistas científicas de diferentes países e por diferentes autores, atestam a inocuidade das substâncias sugeridas pela comissão como passíveis de uso como anabolizantes em nosso país.
A esse respeito, é relevante lembrar que a Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO), na reunião de julho deste ano do Codex Alimentarius (órgão criado em 1962 para, entre outras funções, zelar pela qualidade dos alimentos), considerou seguros os agentes anabolizantes naturais e sintéticos acima citados, à luz da literatura científica existente.
Nesse contexto, fica evidente que se deve evitar criar na população neuroses, preocupações e quimiofobias com afirmações levianas sobre a toxicidade dos anabolizantes e de outros produtos para uso em medicina veterinária.
De fato, que medicamentos são esses? Em que quantidade se encontram nos alimentos? Que testes asseguraram essa toxicidade? Questões como estas e tantas outras são relevantes, pois as modernas técnicas de análises de resíduos em alimentos têm permitido detecção de quantidades diminutas dos mesmos, sem nenhum significado toxicológico.
Reitero que as informações acima são embasadas cientificamente. A esse respeito, talvez seja válido lembrar que a FAO/ONU, na última reunião do Codex Alimentarius, entendeu por bem definir que somente a ciência embasará seus critérios de julgamento.
Que o mesmo seja feito em nosso país, para que se respeite a palavra empenhada na reunião de Roma e o trabalho daqueles que se dedicam, em seus laboratórios, à busca da verdade, do progresso e do bem comum. Afinal, como disse Freud, "a ciência não é uma ilusão; ilusão seria acreditar que pudéssemos encontrar em outra fonte o que ela nos proporciona.

Texto Anterior: A dívida pública está em queda
Próximo Texto: Dez mil comerciantes protestam no México
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.