São Paulo, domingo, 24 de setembro de 1995
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Pasteurização surgiu para salvar safra de vinho

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Quando se fala em pasteurização, o primeiro produto que vem à mente é o leite. Na verdade, Pasteur começou usando o processo que leva seu nome para salvar a produção de vinho em uma região da França. Depois se percebeu que era um processo utilíssimo para preservação de outros alimentos.
O diagnóstico, e o processo que ele empregou, são simples. Pasteur descobriu que o problema com o vinho era a presença de micróbios que o estragavam. Para matá-los, aqueceu o vinho a uma temperatura em torno de 60 oC por alguns minutos.
Curiosamente, Pasteur não foi o primeiro a defender a pasteurização. A idéia de aquecer o vinho já tinha sido sugerida antes, em 1795, por Nicolas Appert, que inventou o método de preservar alimentos em latas. Mas foi depois de Pasteur que o método se disseminou, e que também se explicou o motivo de sua eficácia.
A pesquisa de Pasteur foi o exemplo clássico de um trabalho "aplicado" que teve origem em trabalhos anteriores do que hoje se chamaria pesquisa "pura".
Foi uma consequência de seu trabalho de demolição da teoria da "geração espontânea", segundo a qual a vida poderia surgir de matéria inanimada, praticamente do nada.
Ele demonstrou que os casos em questão envolviam microorganismos presentes no ar -sempre dispostos a achar um local favorável à sua "germinação".
No caso do vinho, há o levedo que causa a fermentação, que pode estar contaminado por outros micróbios nocivos. O vinho vira vinagre graças a microorganismos que promovem a oxidação do álcool.
A teoria dos germes foi importante por direcionar a pesquisa em torno de "alvos" agora identificáveis, como bactérias e vírus. Graças a isso, Pasteur e colaboradores puderam fazer as primeiras vacinas produzidas cientificamente.
Mas uma consequência mais imediata foi a própria higiene. Os médicos começaram a perceber o valor da limpeza, hoje tão obviamente associada a hospitais, que nem parece que um dia ela nem era considerada um fator na disseminação de uma doença.
O francês Alphonse Guérin foi um pioneiro da limpeza dos ferimentos e do uso escrupuloso de bandagens limpas. O britânico Joseph Lister criou a assepsia durante as cirurgias e demais procedimentos médicos. O próprio Pasteur foi pioneiro no uso de autoclaves, equipamentos onde os instrumentos são esterilizados por calor e pressão.
O segundo grande impacto da teoria dos germes foi a quimioterapia. Descoberto o alvo, tratava-se de atacá-lo.
Descobrir qual droga age contra determinado agente patogênico é um processo bem mais complexo que lavar as mãos ou esquentar leite, porém. Depende de progressos em outra disciplina científica, a química, por exemplo na síntese de novos compostos, ou na análise dos já existentes.
Só no século 20 a quimioterapia se desenvolveu mais rapidamente. A descoberta dos antibióticos deslanchou a era de otimismo médico que só nos anos 80 e 90 foi um pouco refreada. Em compensação, as promessas da engenharia genética são uma nova fonte de expectativas.
(RBN)

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