São Paulo, segunda-feira, 25 de setembro de 1995 |
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Emenda tributária beneficia latifúndios
ANA MARIA MANDIM
O governo quer transferir para os Estados, já em 1996, a responsabilidade pela cobrança do ITR: eles ficariam com até 75% da arrecadação, repassando, no mínimo, 25% para os municípios. Atualmente, a União fica com 50% da arrecadação. A outra metade vai para as prefeituras. Ao propor a transferência, a proposta de emenda constitucional que trata da reforma tributária retira da atual Constituição o parágrafo 4º do artigo 153. Esse parágrafo diz que a alíquota (percentual do tributo) do ITR deve ser fixada de forma a desestimular a manutenção da propriedade improdutiva. Por isso, a cobrança do ITR é progressiva: quanto mais terra inútil, mais imposto deve ser pago. O mesmo parágrafo diz que a pequena gleba está isenta do ITR quando for o único imóvel do proprietário que o explore sozinho ou com a família. Retirado da Constituição, o parágrafo 4º reaparece como disposição transitória na proposta de emenda constitucional. A proposta estabelece que a punição à propriedade improdutiva só poderá ocorrer até que seja promulgada lei complementar prevista no artigo 146 da Constituição. Como nem a Constituição nem a proposta de emenda prevêem que a lei complementar estabeleça o caráter punitivo do ITR sobre a propriedade improdutiva, a emenda, da forma como está redigida, pode decretar o fim da utilização do ITR como instrumento de política agrícola e agrária. A análise é de José Antonio Francisco, 28, e de Marcello Pellegrina, 28, técnicos da divisão de Tributação da Secretaria da Receita Federal em São Paulo. Na opinião de José Francisco, para garantir que o ITR continuasse punindo a propriedade improdutiva e não penalizasse a pequena propriedade, o dispositivo do parágrafo 4º do artigo 153 deveria ser mantido na Constituição. Os advogados tributaristas Ives Gandra Martins e Antonio Correa Meyer dão razão aos fiscais. Gandra apontou detalhes técnicos da redação da emenda constitucional que confirmam a possibilidade de a propriedade rural improdutiva deixar de pagar impostos e de a pequena gleba perder a isenção. Segundo ele, a emenda diz que a União ficará com cinco impostos, enquanto o parágrafo 4º do artigo 153 da atual Constituição menciona o inciso VI, que trata da propriedade territorial rural. Além disso, sempre que a emenda se refere a um dispositivo cuja redação será mantida utiliza "pontinhos" para indicar a repetição do texto e, no caso do parágrafo 4º, isso não ocorre. O terceiro detalhe, de acordo com Gandra, é que o imposto sobre o ouro, que na atual Constituição é tratado no parágrafo 5º (e último) do artigo 153, na emenda é abordado no parágrafo 3º, o que significa que o parágrafo 4º foi suprimido. Na emenda, o artigo 153 tem apenas três parágrafos. Meyer acha que o dispositivo não deve ser retirado da Constituição, especialmente a parte relativa à pequena propriedade. "Entendo que é um direito individual o pequeno proprietário não ser onerado com tributos se seu único patrimônio é a gleba, da qual ele e sua família tiram o sustento", diz. ITR O ITR é o único imposto cobrado sobre a propriedade rural no Brasil e é também o mais sonegado do país. O ITR é cobrado sobre a área da propriedade. Para tentar reduzir a sonegação, a Receita Federal fixou um valor mínimo por hectare. A definição de pequena gleba, isenta do ITR, também muda de acordo com a região. No Sul e Sudeste, por exemplo, tem até 25 hectares. No Pantanal Matogrossense, pode ter até 80 hectares. O imposto sobre a propriedade rural existe desde o século passado, mas só a partir de 1964 passou a penalizar a terra improdutiva. Para reduzir o ITR, os proprietários dizem que a terra é altamente produtiva. "Se tudo fosse verdade, o Brasil teria superprodução de alimentos", diz o técnico da Receita João Antonio Francisco. Texto Anterior: Turismo é tema de debate hoje Próximo Texto: Terra desapropriada vira um grande pasto Índice |
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