São Paulo, segunda-feira, 25 de setembro de 1995
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Um momento delicado

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Nunca as seguradoras ganharam tanto dinheiro como no primeiro semestre deste ano. Esse desempenho fantástico foi, em grande parte, fruto da implantação do Plano Real e foi conseguido em função do crescimento do setor no segundo semestre do ano passado.
Não cabe retomar o tema, porque ele foi discutido à exaustão em dezenas de artigos e matérias que analisaram o desempenho atípico da atividade seguradora no período. O que é preciso ressaltar é o que pode acontecer mais para a frente, em virtude de ações que estão sendo implementadas agora e que podem comprometer um pedaço do que foi ganho.
Algumas seguradoras começam a baixar preços, ou a aumentar suas comissões, como se os seus lucros pudessem ser aumentados ainda mais pela simples execução de uma política de preços baixos.
Parece que elas se esqueceram do que aconteceu ao longo do ano de 1993, quando o mercado conheceu prejuízos operacionais inimagináveis e que quase comprometeram o futuro de mais de uma companhia. Elas só se salvaram porque os ganhos com a inflação deu o pouco de fôlego necessário para não serem liquidadas até a chegada do Real.
Mesmo agora, uma leitura mais apurada do "Balanço do Mercado Segurador", publicado pela Editora Manuais Técnicos de Seguros, é suficiente para mostrar que algumas continuam sem as reservas mínimas exigidas por lei. Para bom entendedor, ou mais especificamente para quem conhece o dia-a-dia do mercado, o escrito até aqui deveria bastar, mas eu quero ir além e explicar também para o segurado comum, que é quem acaba pagando a conta, o que poderá se repetir, se estas companhias insistirem no que vem sendo feito.
A verdade é que não é hora de seguradora fazer graça. O que foi ganho não pode ser perdido simplesmente porque alguém acha que baixar preços faz seguradora crescer. Não faz!
Uma das grandes utilidades do estudo do passado é compreender os porquês que levaram as coisas a acontecerem de uma determinada maneira. Assim, é só olhar os balanços de 1993 para saber com certeza qual é o final trágico de uma política de crescimento baseada em comissões altas e preços baixos. Com dois agravantes: agora não existe mais correção monetária e a inflação vai se aproximando de zero, o que deve derrubar os juros, comprometendo, por antecipação, qualquer ação camuflada por resultados financeiros.
As ações dessas companhias estão se desenvolvendo de três formas: A primeira é o aumento da comissão dos corretores, que podem ficar inteiramente com ela, ou repassar parte, na forma de desconto, para os seus segurados.
Alguns corretores já estão recebendo mais de 40% de comissão em automóveis -e isto é insuportável para qualquer companhia, dentro de um cenário econômico estável. Pior ainda, quem paga essa conta, sem ter nada com ela, é o segurado, que é quem paga a comissão de corretagem.
A segunda é o desconto de preços puro e simples. O seguro custa mais barato do que o da concorrência e ponto. Normalmente ele é vendido, para compensar a perda de receita, através das redes de agências dos bancos, ou por contatos diretos, que também acabam custando caro para o segurado, já que, na hora do sinistro, ele não acha ninguém que zele pelos seus interesses.
A terceira, apesar de mais sofisticada, termina gerando prejuízos para a seguradora. É a criação de seguros para "frotas fantasmas", com condições especiais para determinado cenário, mas que são estendidas para todos os segurados, independentemente de qualquer homogeneidade.
Todas já foram empregadas no passado. Elas quase quebraram o setor ao longo de 93 e primeiro semestre de 94.
Os dirigentes das companhias de seguros que estão implantando esse tipo de política não podem perder de vista que os resultados da minirrecessão criada pelo governo só vão se refletir nos balanços do primeiro semestre de 96.
Como os prêmios de seguros devem ser contabilizados de forma proporcional ao tempo de vigência da apólice, os resultados atuais ainda refletem a explosão verificada no segundo semestre de 94 e não captaram os resultados ruins.
O Real trouxe uma série de fatores que permitiram desempenho extraordinário das seguradoras. Além do aumento da procura de seguros de vida, saúde e previdência privada, houve queda no preço dos veículos usados e diminuição dos furtos de carros. Todavia, esses fatores não devem durar para sempre, sendo provável a volta do aumento dos furtos de veículos e a estabilização dos preços dos carros usados.
Com a diminuição dos preços dos seguros de automóveis, as seguradoras engajadas nessa proposta estão aumentando a sua sinistralidade e, a médio prazo, colocando em risco a sua saúde financeira e a indenização do segurado.

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